Fausto Wolff and me
A
literatura de Fausto Wolff me chegou primeiro. As edições da
Codecri se amontoavam nos sebos baratíssimas. E eu, um pé rapado,
comprava aos borbotões os autores lançados, entre eles Fausto Wolff
e Luiz Roncari. Nessa época tinha crença firme de que os
concursinhos literários alavancariam minha “carreira” e a única
instituição, com premiação do tipo, era o Sesc-SJM. Ali foi a
minha Paris dos anos 20, minha Nova Iorque dos anos 60, meu reduto,
onde me entreguei ao bastardo prazer sobre literatura de todo e
qualquer país, por mais inexpressivo que a tensão – já no
finalzinho, claro – da guerra fria permitia olhar com atenção.
Afinal, só os russos e os americanos importavam, a tal bomba e toda
aporrinhação do fim do mundo, explorada exaustivamente pelo cinema
– americano- com intuito terrorista e intimidatório. Gramei muito,
escrevendo bobagens, muitas, na juventude – isto não quer dizer
que não as escrevo hoje em dia, mas que me policio melhor – e com
algumas fui bem sucedido, o que me surpreende ainda, junto a poetas
que considerava de naipe – descobri, posteriormente, meu engano.
Passou, recordo as marcas. E abandonei as premiações. Não, não é
verdade. Tive uma recaída com a Granta. Corrigida, diga-se de
passagem. Voltemos a Fausto Wolff: um herói sem homenagens da
literatura contemporânea. Meu avô paterno – judeu – me deu o
livrinho Os Palestinos. E confessou-me atrapalhado que não era um
sionista e tampouco um ladrão, mas com certeza, apesar de Roosevelt,
alimentava desprezo pelo descompasso criado pelos americanos em sua
terra natal. Frisava que não era aquela inventada, enfiada a força
goela abaixo dos árabes, mas a Terra mitológica. Aparte feito,
retomemos a missa. Li o primeiro livrinho de Wolff com meus dez ou
doze aninhos, não lembro bem. E o comentário de meu avô foi o
seguinte: “Não é porque sejas burro, porém entenderá pouco do
aí está. Retome a leitura com mais idade”. Para provar-lhe de que
não era um asno, fiz até um resumo bem feito do livro, mas a
dimensão política me escapava. Não parei de ler Fausto Wolff. Li
todo livro que pude botar a mão. Não o conhecia pessoalmente,
apregoava-se de que era um gigante – alto, tão alto e branco como
o Kilimanjaro – e o uísque, o seu cão engarrafado. Um outro
escritor, Luiz Horácio Rodrigues, fez o favor, porque era secretário
de Wolff, de me apresentar a ele. Trocamos figurinhas, falamos
de literatura e descobri que não sabia muita coisa de literatura. E
eu lia igual a um corno. Mais tarde, tomado de coragem, mandei um
conto – TODOS OS HOMENS SÃO IGUAIS – para ele. A resposta
tardou, mas veio: ENXUTO, SINCERO, ORIGINAL, FAUSTO WOLFF. Foi em
2008. A literatura de Fausto era todo ele: grandiosa, generosa e
anônima, mas radiante como um sol descoberto em outra galáxia.
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