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Mostrando postagens de abril, 2008

Talento é Genético?

“Sim, você poderá vir a ser um grande escritor. Mas não depende só de você, é claro, ou de sua vontade. O talento é genético.” O neurologista Nuno Lobo Antunes, em determinada entrevista, veiculada em uma revista médica especializada portuguesa, afirma: o talento é genético e hereditário, podemos treinar – físico e cérebro – mas existem limites em relação ao que podemos modificar e até onde podemos evoluir. Os argumentos presentes na entrevista deste neurologista surgiram recentemente na opinião de um crítico literário a respeito de minha obra, e, está expresso na frase inicial desse texto, onde vaticina que não depende só de mim, ou da minha vontade, mas que se eu não carregar em meus genes a codificação necessária para me tornar um escritor – todo meu esforço resultará inútil. Este tipo de argumentação, baseado em determinismos biológicos, deveria estar banido das alegações médicas; não deveria freqüentar os círculos sociais nem como piada, porque reforça idéias que no passado servir

A Caminho da Perfeição

Mariel, este conto é muito estranho e nem parece ter sido escrito por você. É bem diferente dos demais. Bem elaborado, do começo ao fim. Quase uma obra-prima. Entretanto, é preciso fazer mais uma revisão, nas vírgulas, sobretudo. Abraço. NM Nilto Maciel, ensaísta e escritor cearense, escrevendo sobre a nova versão de Todos Os Homens São Iguais, postada logo abaixo.

Todos Os Homens São Iguais

Este conto já frequentou as páginas do Cativeiro; mas a tarefa do escritor é reescrever sempre, explorando todas as possibilidades exrpessivas dos recursos de que dispõe. Então aí está o resultado. Charlton atravessou rápido a rua. A multidão não esperava vê-lo ali, naquela hora, no ponto alto do protesto, vestido elegantemente em um terno preto, mirava com olhar penetrante os guardas que formavam um cordão de segurança para impedir a entrada dos manifestantes. Pediu passagem à multidão, que imediatamente obedeceu. Subiu pelo elevador até o último andar do prédio, lá, sentado em uma cadeira estava o presidente da organização. Pela janela observava o coro dos manifestantes, pedindo justiça. A maioria homens negros, vestidos com simplicidade, empunhando cartazes com palavras de ordem. O presidente da organização não se deu o trabalho de notar que Charlton estava em sua sala. Adivinhava a presença dele pelo ruído do sapato no carpete. Dirigiu algumas palavras ao ator: - O que faz aqui na

Editora Calibán - Vale a Pena Conferir

A editora Calibán – pequena e valente - capitaneada pela escritora Patrícia Tenório e o poeta Majela Collares, lançou recentemente cinco livros de autores clássicos por preços convidativos – R$ 10,00 – que merecem ser prestigiados. A concepção gráfica charmosíssima, acompanhada por textos quase desconhecidos de renomados autores da literatura universal deve ser levada em conta. Darei apenas dois exemplos. Martins Pena, dramaturgo, representado pela comédia As Casadas Solteiras, uma peça de costumes em que o autor analisa com muito bom humor os percalços em busca de um bom casamento. Machado de Assis retratado no volume intitulado Quatro por Quatro; neste livro o poeta Majela Collares seleciona do Bruxo do Cosme Velho algumas de suas jóias, ajudando-nos a investigar o fenômeno inesgotável da escrita deste autor. E mais: Bucólicas, Virgílio Trad. Claudio Aguiar. Em Busca do Logos, Walter Luís Avelar. Histórias deTrancoso, Gonçalo Trancoso.

Sobre John Fante Trabalha no Esquimó

Fausto Wolff sempre pontualíssimo em suas considerações, acerta em cheio, proclamando: Enxuto, sincero, original. Fausto Wolff

A Carruagem de Fogo

por Rodiney da Silva e Silva Junior Resolvi voltar a escrever. Não sei o porquê. Também não sei por que parei, se ainda tenho tantas idéias na cachola. Talvez também sejam as idéias, pois existem idéias que não se escrevem, apenas as vive. Estranho isso, viver idéias. No século dezenove se morria por elas. Hoje, se vive por elas. No meu caso, voltei a escrever por que lembrei de minha mãe. Assim como Carlos, se eu fosse o Rei do Mundo, criaria uma Lei onde fosse proibida a morte das mães. Mãe é coisa eterna. Talvez o paraíso estivesse com o efetivo pequeno de mães... Talvez voltei a escrever por ter a mente abarrotada de idéias, precisando de um escape. Já disse, certa vez, que me expresso melhor pelas letras. Pelas letras me escondo mais, me distancio mais; porém fico mais aceitável a mim mesmo, a Deus e aos outros. As letras me transportam para o mundo ideal. Talvez voltei a escrever para minha salvação. Ou satisfação. Não escrevo para

A Marca de Caim

As linhas gerais de um crime. Anna é a segunda esposa de Alexandre, têm com ele dois filhos pequenos. Anna não demonstra publicamente ciúme, não procura competir diretamente com a filha do primeiro casamento de Alexandre. Esta medida tem por objetivo não desgastar a relação, porque ela o ama de uma maneira doentia e não admitiria perdê-lo em hipótese nenhuma. Contudo, Alexandre percebe se infiltrar o ciúme em sua relação com sua esposa; tenta dissuadi-la que não o perde para filha do primeiro casamento, que Anna associa sempre à sombra da ex-mulher. Isto parece irritá-la. As coisas se agravam porque Anna recentemente (três meses, para se dizer com exatidão) tivera depressão pós – parto, as emoções intensificadas fazem com que Anna se descontrole facilmente. Anna não planejava a morte de Isabella. Naquele passeio do dia 29 de Março não estava escrito que o crime iria ocorrer. Não se pode, entretanto, chamá-lo de acidente. Neste dia a família saiu para um passeio, foram ao supermercado,

Parábola Kafkiana Sobre o Trabalho

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Existe uma enorme construção sem janelas. O longo edifício cinzento tem uma porta estreita, não tem elevadores; os lances infindáveis de escada levam ao topo onde ninguém jamais ousou ir.O escritor o observa largo tempo, estuda com cuidado uma maneira de subir até ao terraço do prédio, e, se equipa com materiais especiais para a escalada, porque o longo edifício é como uma montanha lisa. O equipamento às costas, com rolos de corda, pequenas picaretas que fendem as paredes lisas, ele se esforça para levar-se, corpo acima, desprezando a possibilidade das escadas que poderiam lhe poupar o trabalho, apesar do cansaço equivalente. Quando se depara com o desânimo, finca os olhos no topo, onde as nuvens estão aninhadas como pássaros translúcidos, e, redobra a vontade, apresentam-se outras razões para que se mantenha na tarefa. O vento às vezes parece querer arrancá-lo da parede, cola o corpo ao edifício até que a corrente de ar cesse.

Galáxias e Tempestades

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Cantos, de Ezra Pound, traduzido por José Lino Grunewald, é um livro que combina uma ambição enciclopédica – a isto refiro a vontade do poeta em dialogar com todas as coisas circunstantes da cultura, ampliando este conceito através das incursões de seus poemas que conjugam fatores que poderiam ser considerados excludentes, neste diálogo totalizador da linguagem, porque assim os ideogramas convivem em perfeita harmonia com signos de outras origens, combinando poder polissêmico e semântico. Nesta tradição, alinhado ao trabalho poundiano, surgem poetas que pretendem uma elaboração absoluta, pondo por terra as barreiras comumente impostas pela cultura quando divide o conhecimento em compartimentos estanques, sem comunicação de seus valores, sem que se possa alinhá-los e descobrir-lhes o ponto comum. A experiência da poesia contemporânea abandonou esta idéia do absoluto, concentrando-se em um projeto particular da investigação do sujeito, naquilo que se convencionou chamar de eu lírico. Nes

De Cabeça Baixa - Flávio Izhaki

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De Cabeça Baixa Flávio Izhaki Ed. Guarda - Chuva R$ 24,90 A leitura do romance de estréia deste autor carioca pode ser definida como sui generis dentro do campo em que se desenvolve: a ficção contemporânea. Não porque se desgarre por completo das questões abordadas por seus principais autores – João Paulo Cuenca, Cecília Gianetti e Daniel Galera – que trabalham a meta ficção como eixo alternativo a narrativa tradicional – isto é, a realista. Diversificando o modo de leitura deste real através de prismas subversores deste tipo de literatura tão identificada com os elementos narrativos canônicos: intriga, personagens e ação. Flávio Izhaki paga também o tributo a esta senda aberta por ficcionistas de portes variados – Borges é um ilustre desta galeria – colorindo a seu modo isto que já se poderá chamar de técnica do novo romance neste novo milênio, confeccionada através do jogo intelectual – nisto se avizinhará dos romances policiais; a linguagem elaborada em um registro que comporte tant

Iberê

O calor das ruas estava insuportável. O bairro de Botafogo asfixiado pelo trânsito e sirenes, os prédios esgueirando-se para chegar ao céu como a Torre bíblica, e, nas janelas a existência congelada de uma parcela da população aposentada, desempregada, ou, simplesmente de homens que apenas observam a paisagem móvel e multicolorida, instantânea das multidões. A multidão, este monstro, arrastando-se pelas ruas, desatinada e intranqüila, desaguando nas portarias dos edifícios, escoando pela abertura dos bares, lojas e shoppings como por um ralo que mais a frente confluísse para uma nova rua e sistematicamente tudo isso voltasse a acontecer. Meu olho fixo no chão, empurra para trás a saudade da minha terra, longe, de infinitos horizontes, onde repousa o homem na sela de seu cavalo, sentindo o vento frio das cordilheiras, acossado pelo sotaque dos vizinhos. Lembranças que carrego comigo dentro dessa metrópole, nessa cápsula que é o meu corpo a me conduzir como um estímulo nervoso pelas célu

A Grata Correspondência com Luiz-Olintho Sobre John Fante Trabalha no Esquimó

A grata correspondência com Luiz-Olyntho, escritor e psicanalista, combina sensibilidade e percepção aguda da literatura e seus problemas. Um forte abraço desse seu admirador, Caro Mariel Reis Grato por suas palavras, e por sua confiança. Lerei seus contos logo que possível e, se puder, direi algo. Gostei que não tivesse se assustado com a possibilidade da porta dar para a parede; Melville fez disso a riqueza de Bartleby. E também a portas que dão para um jardim: assim começam os Contos de Nárnia. Se neste entrementes quiser contar-me mais alguma coisa a seu respeito, fique à vontade. Atenciosamente Luiz-Olyntho Caro Mariel Reis Comecei a ler seu livro. Li até Viagem. Gostei de sua apresentação. A questão do anonimato. Um tema que sempre me seduziu. Algumas vezes pensei em algum pseudônimo para quando publicasse algum texto que não de Psicanálise. Mas até agora nenhuma editora ou revista se interessou por meus textos. Verdade que também não tenho me dedicado a procurar editora para

Todos Os Homens São Iguais

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Charlton atravessou rápido a rua. A multidão não esperava vê-lo ali, naquela hora, no ponto alto do protesto, vestido elegantemente em um terno preto, mirava com olhar penetrante os guardas que formavam um condão de segurança para impedir a entrada dos manifestantes. Pediu passagem à multidão, que imediatamente obedeceu. Subiu pelo elevador até o último andar do prédio, lá, sentado em uma cadeira estava o presidente da organização. Pela janela observava o coro dos manifestantes, pedindo justiça. A maioria homens negros, vestidos com simplicidade, empunhando cartazes com palavras de ordem. O presidente da organização não se deu o trabalho de notar que Charlton estava em sua sala. Adivinhava sua presença pelo ruído do sapato de Heston no carpete. Dirigiu algumas palavras ao ator “O que faz aqui na minha sala? Marcamos alguma reunião? Não estou interessado em patrocinar nenhum de seus filmes”. “Eu não concordo com o espancamento daquele homem”, disse. “Homem negro, você quer dizer, não é”

Sobre John Fante Trabalha no Esquimó

Este blogue tem a honra de receber essas palavras de um professor querido do meu período de formação universitária na faculdade UERJ. Ele, Gustavo Bernardo, leu o JOhn Fante Trabalha no Esquimó e me brindou com as palavras abaixo para minha contracapa. Agora só falta a editora me dar a bandeirada de largada para a sorte ser completa. Prof. Gustavo Bernardo não sei como pagar-lhe a homenagem. Um abraço forte a todos com que tenho dívidas desta natureza A FICÇÃO DE MARIEL REIS Gustavo Bernardo A ficção de Mariel Reis, como toda boa ficção, engana. À primeira leitura, ela parece neo-realista, partindo das ruas mais ou menos sujas de uma cidade brasileira muito parecida com a cidade do Rio de Janeiro. Entretanto, exercita uma ironia tão ácida e tão séria que leva suas histórias ao extremo oposto de qualquer realismo. Mariel joga com a realidade e com a própria ficção, produzindo um trabalho metaficcional que obriga o leitor a suspender seus juízos tanto sobre a vida quanto sobre a litera

Elogios de Saint Clair Stockler na Internet

Estes no TodoProsa ( http://todoprosa.com.br/?comments_popup=338 ) " Mariel Reis foi meu colega de turma na Letras. Figura incrível. Generosíssimo, simpático, bem-humorado. Um cara realmente fantástico. Gosto muito dele, embora tenhamos atualmente pouco contato. Mas o respeito mútuo (sei que ele gosta muito de mim também) existe sempre. Conheço alguns dos contos dele, mas ainda não li o livro. Ele é ótimo mesmo, tem um olhar sobre o subúrbio muito bom - a literatura carioca é, em sua quase totalidade, uma literatura da zona sul. Nada contra, mas eu gostaria de ouvir as vozes do subúrbio também (o Marcelo Moutinho, com a sua antologia "Prosas Cariocas", deu vez/voz a um punhado de autores cujas histórias se passavam no subúrbio, entre eles o Mariel e o Vinícius Jatobá, com um conto lindíssimo: "Ana antes da chuva", se bem me lembro do título). Tem muita gente boa por aqui. Gente sem muita chance de sobressair, infelizmente, até porque a ação - quando há ação - e

O Leitor de Corpo Inteiro

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O expediente da leitura em livrarias era o meu favorito. O dinheiro era curto, não sabia quando poderia comprar o livro, então, me enfurnava durante uma hora, todos os dias, na tentativa do término da leitura do volume exigido do meu curso de graduação. Nesta época, minha irmã havia interrompido o estudo, preferindo o baile funk; os namoros no paredão, apoiado por meu tio que via uma perda de tempo no meu esforço por conseguir o curso superior. Ou, então, contrariando as expectativas, afirmar, com o comportamento de minha irmã, que ela poderia ser bem sucedida aliando indisciplina – as noites passadas no baile – com certa espontaneidade – a teoria de que o universo conspiraria a favor de um individuo se de fato ele fosse talhado para determinada missão, encarregando o destino de realizar boa parte daquilo que cabe a pessoa fazer. Isso me entristecia, por vê-los sempre alegres, enquanto, grave, mantinha o leme firme sob as mãos para a embarcação não se perder. Não desanimei. O hábito d

O Meu Aniversário e As Noites Místicas

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O meu aniversário coincidia com as crises... Era desta forma que eu começava minha primeira redação escolar, porque minhas lembranças de aniversário associavam-se aos períodos críticos enfrentados por minha família ao longo do ano, sempre alguém estava desempregado, passando doença e não era raro episódio de morte. Isso tornava bastante desagradável aniversariar lá em casa, portanto passei a fugir como o diabo da cruz da data festiva, criando maneiras de burlar a comemoração, impedindo deste modo à desgraça de se aproximar dos meus familiares. Desconfiei até que era uma espécie de maldição. Perguntei várias vezes se minha avó não teria proferido em sua fúria alguma praga, enquanto repousava eternamente em berço esplendido, na barriga de minha mãe. A hipótese nunca teve confirmação, mas não foi negada. Apesar de minha avó paterna ter uma ligação especial comigo, sempre pensei em mau agouro. Superstições como olho grande. Na minha redação escolar sempre trazia uma fato sobrenatural, reti

Meu Tio, O Encantado

Para Danilo, meu tio, o encantado Quando meu tio enlouqueceu – isto é por volta da década de 80 – ele se aproximou de uma árvore, conversou dez minutos com seus galhos, alisou as folhas dos ramos mais baixos, colou o corpo ao tronco, invocou por nomes estranhos. Saiu aluado do encontro. Quando meu tio enlouqueceu – isto é por volta da década de 70 – ele se aproximou do sol, levando uma escova de cabelos, confeccionada em aço, porque não concebia substância melhor para agüentar as temperaturas dos raios solares, apresentou-se ao sol como barbeiro real, e, escovou cem vezes os raios que caiam sobre a terra, as flores e os homens. Saiu desse encontro siderado. Quando meu tio enlouqueceu – isto por volta da década de 60 – ele se deitou no longo gramado de uma quinta, fincou os dedos na terra, revirou torrões com as mãos, fixou os olhos longamente nas nuvens, um anjo corria de um la

O Elefante e o Medo do Escuro

A primeira estória, isto na infância, que procuraram incutir na minha cabeça foi a de um elefante medroso. Até hoje, ao certo, não tenho o autor dessa jóia, e , creio, deveria se tratar de um modo para me curar do medo do escuro. Um dia com uma crise de nervos insuportável, o elefante sai desatinado pela floresta. Depara com uma cabana. Usa a tromba para bater na porta. Toc, toc. Bate mais forte. Ouve uma voz forte, gritando: “Já vai”. O coração aos pulos, as orelhas atentas aos ruídos noturnos, sua chance estava em ficar ao lado daquele pequenino sol brilhando na sala daquela cabana. A porta não abria. Uma aflição fez com que batesse mais uma vez; surgiu um homem no adro da porta. Vestia-se como um caçador. Era um caçador. O elefante não percebera, pediu licença para entrar e se abrigar da escuridão, concedida pelo homem que trazia um gorro vermelho enfiado na cabeça. Dentro da cabana, o elefante se sentiu mais seguro. O caçador resolveu tomar partido do medo do animal, contando, com

O Narrador , ou O Olho - Porco

Eu, tudo eu, só eu, reclamei durante minha infância e parte da adolescência. Minha vida era observar as cerimônias familiares, tanto da parte do meu pai quanto de minha mãe. Meu pai me chamava de O Olho – não por minha capacidade inata de observação dos fatos, mas por minha gula. Era uma abreviação de olho grande, porque toda minha concentração estava em mastigar. Parecia um urso se preparando para hibernar, acumulando ao máximo gordura. Minha mãe concordava com o apelido. E somava ainda outro, tornando composta minha denominação, esse bem menos agradável, referindo-se aos meus hábitos higiênicos tão poucos em dias. Talvez meu contato com o surrealismo tenha vindo desta combinação de palavras Olho – Porco. Olho – Porco era um apelido que tinha muito de palavras mágicas. E , acabava por me transformar nesse animal fantástico, enorme, flutuando acima das cabeças, como um balão em forma de porco ou um olho gigantesco que grunhisse. Isso atiçava minha imaginação. O Olho – Porco teve uma du

O Casamento de Meu Pai e Minha Mãe

O casamento, enfático, será no civil. Meu avô frisava. Preocupado com a reação desproporcionada de minha avó materna, da retaliação caso tentasse um acordo para casá-los no Salão do Reino. E a descoberta que o abismou – a falta de crença no Cristo desse povinho das terras onde corre o leite e o mel. Também no Salão não se falava muito de Cristo, um coadjuvante de luxo no evangelho, era tudo Jeová para lá, Jeová para cá, seja feita a vontade de Jeová. Não desprezavam o Filho de Deus, mas, sempre pediam para que Ele fosse dar uma voltinha com o dinheiro do sorvete para não atrapalhar a conversa dos adultos. Minha mãe, negra, conseguida uma bolsa de estudos na América, segundo a imaginação dela a terra prometida das cozinhas ultra – moderna, pensou que lá fincaria sua bandeira e independência. A limusine do ministério da educação trouxe um figurão para conversar com meu avô a respeito de autorização para que ela partisse para esse exílio de sombra e incerteza, como meu avô classificava;