04 pemas de Mariel Reis

I


Retirei-me para o grotão da floresta.
Lá eu era amparado pela grama,
E a única música vinha dos pássaros.
Ali, abandonado pelos homens,
Consultava os meus pensamentos,
E cantava salmos ao meu Deus interior.
Ali, cercado pelo esquecimento,
Meu corpo repousava dos assaltos,
E bania de si todas as suas impurezas.
Ali, sem nenhuma outra criatura,
Meditava sobre a beleza e sua efemeridade,
Porém, à Sua lembrança, doía meu coração.
Eu me dobrava nos exercícios de solidão
Ocupava minha boca com os hinos,
Tudo se mostrava infrutífero.
A aragem da floresta era o seu hálito,
Sua voz maviosa, a canção dos pássaros,
E a grama reluzente e macia, o seu colo.
O meu retiro foi inútil, constatei,
Ao investir em minha fuga,
Aumentei o Seu jugo:
Encontrei-A refletida no mundo.


II


Era Verão. Livrei-me das roupas.
De um ponto Tu irradiavas calor intenso,
Julgava-me em completa possessão
Ao ocupar-me de tal pensamento:
Percorrias meu corpo com a Tua mão?
Travestida de Deusa dissipava
De minha natureza toda ambição,
Quando ao meu ouvido colavas
Os Teus lábios comovidos em oração:
Existes apenas enquanto Te penso?
Nada poderia separar nossa substância
Eu rodopiava com meus pés na relva,
O calor que Tu irradiavas encandecia
Toda a minha natureza solícita
Às Tuas carícias depositadas no mundo:
Os teus lábios logo me fizeram mudo.



III


Se não é para Ti o dia
Por que irei celebrá-lo?
Não retirarei meu manto,
Nem me atirarei ao lago,
Ou permitirei que a luz
Visite meus aposentos.

Se não é feita da Luz
Que rodeia as criaturas,
Se Tua ventura é a noite
E tudo que nela habita
Despirei o meu manto
Quando da Tua visita.

Se a cisma de um deus
Macular toda esperança,
E a noite julgada imprópria
Para ser Tua morada
Ó criatura sem alvorada
Faça do meu corpo Tua casa.


IV

Em meio a turba da praça
Levanto meu olhar alheio,
O meu corpo esvaziado
Testemunha a noite anterior.
Se não é mais amor, ter medo?
Não quero dividir meu abrigo
Com a dor; não é mal estar sozinho.


V

As minhas palavras gentis
Não me fazem um poeta;
O meu perfume tampouco
Pode me tornar uma flor;
O meu andar, embora gracioso,
Não são as pernas da garça;
A minha coragem pouco
Pode me fazer como o leão;
O homem, minha amada,
É o que o mora em seu coração:
Embora ele possa abrigar
Em si também a fatalidade.
Agora, por sua Graça, sou o poeta,
Agora, por sua Graça, sou a flor,
Agora, por sua Graça, sou a garça
Agora, por sua Graça, sou o leão.

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