O Casamento de Meu Pai e Minha Mãe
O casamento, enfático, será no civil. Meu avô frisava. Preocupado com a reação desproporcionada de minha avó materna, da retaliação caso tentasse um acordo para casá-los no Salão do Reino. E a descoberta que o abismou – a falta de crença no Cristo desse povinho das terras onde corre o leite e o mel. Também no Salão não se falava muito de Cristo, um coadjuvante de luxo no evangelho, era tudo Jeová para lá, Jeová para cá, seja feita a vontade de Jeová. Não desprezavam o Filho de Deus, mas, sempre pediam para que Ele fosse dar uma voltinha com o dinheiro do sorvete para não atrapalhar a conversa dos adultos.
Minha mãe, negra, conseguida uma bolsa de estudos na América, segundo a imaginação dela a terra prometida das cozinhas ultra – moderna, pensou que lá fincaria sua bandeira e independência. A limusine do ministério da educação trouxe um figurão para conversar com meu avô a respeito de autorização para que ela partisse para esse exílio de sombra e incerteza, como meu avô classificava; ele, dentro dos princípios que lhe eram caros, negou. Abismou as autoridades o reacionarismo daquele sujeito, porém quando apresentou as razões, os milicos sorriram, entreolhando-se, concordando que nem tudo estava perdido nesse país. Meu avô disse que não criara filha para ser instruída, mas para ser dona de casa. Este tipo de ambição destruía as famílias, corrompia o espírito de uma nação que tem como pilar a mulher.
Os milicos tomaram o caminho da rua. Minha mãe se lamentou; mas não poderia dobrar o pai. Tampouco o destino. Já havia se livrado de casar com um homem do Salão, o que era uma grande vantagem. Então estava no lucro.
Minha avó paterna também concordou: no civil, somente no civil essa patacoada pode acontecer. Nisto ambas as partes familiares tinham razão. A intolerância tinha pouco haver com os motivos da decisão, era, mas os brios remexidos de cada um dos lados que forçava o radicalismo. Meu pai mesmo não fazia questão do casamento – o ortodoxo. Não se incomodava. Minha mãe só queria se ver livre de mutuas acusações de desgraçar clãs estruturados, com uma história a ser zelada.
Escolhido o cartório. A cambada toda presente. De um lado, os familiares paternos, vestidos a caráter. Do outro, de mesma forma, os parentes maternos, envergando ternos limpos e brilhantes. Se o caráter do evento não fosse notório, poderia se arriscar que tinham fugido todos de um baile de carnaval – porque a seriedade aguda até hoje parece perfurar a fotografia daquele momento histórico, segundo meu pai. A tensão começou quando a mulher que lavrava a sociedade matrimonial se meteu a dizer algumas palavras para os nubentes. A coisa rebentou em revolta. A merda fedeu. Porque para este mulher não importava o que dissesse, acreditava na universalidade dos votos de felicidades, que durante todo o período de profissão lhe garantiram sucesso e aplausos de muitos dos casais e familiares. Cada palavra era reprovada tanto por um lado quanto por outro. Até que a fieira da paciência se partiu e um dos meus tios, mesmo contrariando os ritos, mesmo não se sabendo investido de tal poder, começou ali mesmo à sua maneira, quer dizer a maneira da família Simon/Scanzi, a casar meu pai e minha mãe. O que obteve logo resposta veemente da parte materna. O samba do crioulo doido obrigou que a casamenteira se apressasse, antes que a catástrofe sobreviesse. O tempo fora insuficiente.
O pau já comia na casa de Noca. A policia convocada não sabia distinguir de onde partira a enxurrada de sopapos e pontapés, mas como a família de minha mãe só tinha negros, eles não hesitaram em reprimir primeiro aquela ala suspeita. Depois foram pros branquelos perguntar se tinham levado alguma coisa e etcetera. Minha avó paterna quebrou o pau com o policial, que marginais que nada, a única coisa errada que aqueles tinham cometido era querer se misturar isso ela não iria admitir e danou a falar palavrões. A confusão recomeçou com mais força. Os policiais eram em menor número. À noite, acabaram na delegacia. Com desculpas de ambos os lados, com o delegado lamentando, dispensando-os com as seguintes palavras: ”Distintos, foi apenas um casamento, não é o fim do reino da Áustria”. Minha avó paterna não se conteve, esbofeteou o herege. Passou a noite na tranca para amansar. Quando saiu na manhã do dia seguinte, meu tio paterno, envergonhado, pediu: ”Mamãe fica quieta, não arrume mais confusão”. Ela, quizumbeira, “Não seja frouxo, onde já se viu palavras desastradas”.”Não foi o fim do reino da Áustria”. Deu um muxoxo, e, entrou no carro.
Minha mãe, negra, conseguida uma bolsa de estudos na América, segundo a imaginação dela a terra prometida das cozinhas ultra – moderna, pensou que lá fincaria sua bandeira e independência. A limusine do ministério da educação trouxe um figurão para conversar com meu avô a respeito de autorização para que ela partisse para esse exílio de sombra e incerteza, como meu avô classificava; ele, dentro dos princípios que lhe eram caros, negou. Abismou as autoridades o reacionarismo daquele sujeito, porém quando apresentou as razões, os milicos sorriram, entreolhando-se, concordando que nem tudo estava perdido nesse país. Meu avô disse que não criara filha para ser instruída, mas para ser dona de casa. Este tipo de ambição destruía as famílias, corrompia o espírito de uma nação que tem como pilar a mulher.
Os milicos tomaram o caminho da rua. Minha mãe se lamentou; mas não poderia dobrar o pai. Tampouco o destino. Já havia se livrado de casar com um homem do Salão, o que era uma grande vantagem. Então estava no lucro.
Minha avó paterna também concordou: no civil, somente no civil essa patacoada pode acontecer. Nisto ambas as partes familiares tinham razão. A intolerância tinha pouco haver com os motivos da decisão, era, mas os brios remexidos de cada um dos lados que forçava o radicalismo. Meu pai mesmo não fazia questão do casamento – o ortodoxo. Não se incomodava. Minha mãe só queria se ver livre de mutuas acusações de desgraçar clãs estruturados, com uma história a ser zelada.
Escolhido o cartório. A cambada toda presente. De um lado, os familiares paternos, vestidos a caráter. Do outro, de mesma forma, os parentes maternos, envergando ternos limpos e brilhantes. Se o caráter do evento não fosse notório, poderia se arriscar que tinham fugido todos de um baile de carnaval – porque a seriedade aguda até hoje parece perfurar a fotografia daquele momento histórico, segundo meu pai. A tensão começou quando a mulher que lavrava a sociedade matrimonial se meteu a dizer algumas palavras para os nubentes. A coisa rebentou em revolta. A merda fedeu. Porque para este mulher não importava o que dissesse, acreditava na universalidade dos votos de felicidades, que durante todo o período de profissão lhe garantiram sucesso e aplausos de muitos dos casais e familiares. Cada palavra era reprovada tanto por um lado quanto por outro. Até que a fieira da paciência se partiu e um dos meus tios, mesmo contrariando os ritos, mesmo não se sabendo investido de tal poder, começou ali mesmo à sua maneira, quer dizer a maneira da família Simon/Scanzi, a casar meu pai e minha mãe. O que obteve logo resposta veemente da parte materna. O samba do crioulo doido obrigou que a casamenteira se apressasse, antes que a catástrofe sobreviesse. O tempo fora insuficiente.
O pau já comia na casa de Noca. A policia convocada não sabia distinguir de onde partira a enxurrada de sopapos e pontapés, mas como a família de minha mãe só tinha negros, eles não hesitaram em reprimir primeiro aquela ala suspeita. Depois foram pros branquelos perguntar se tinham levado alguma coisa e etcetera. Minha avó paterna quebrou o pau com o policial, que marginais que nada, a única coisa errada que aqueles tinham cometido era querer se misturar isso ela não iria admitir e danou a falar palavrões. A confusão recomeçou com mais força. Os policiais eram em menor número. À noite, acabaram na delegacia. Com desculpas de ambos os lados, com o delegado lamentando, dispensando-os com as seguintes palavras: ”Distintos, foi apenas um casamento, não é o fim do reino da Áustria”. Minha avó paterna não se conteve, esbofeteou o herege. Passou a noite na tranca para amansar. Quando saiu na manhã do dia seguinte, meu tio paterno, envergonhado, pediu: ”Mamãe fica quieta, não arrume mais confusão”. Ela, quizumbeira, “Não seja frouxo, onde já se viu palavras desastradas”.”Não foi o fim do reino da Áustria”. Deu um muxoxo, e, entrou no carro.
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