O Sonho Acabou



‘Todos nós fomos contaminados pela esperança de que havia genuinidade nas motivações e, principalmente, autonomia, que as críticas se dirigiam as falências dos partidos e seu esvaziamento ideológico, mas tudo deu na mesma. O MPL falou, o MPL avisou “Essa é uma defesa histórica das organizações de esquerda”. Quem afirmará o contrário, se é a palavra do rei? Quem o fizer correrá o risco de piquetes em sua porta, coquetéis molotov e afins. Se o MPL representa a defesa histórica das organizações de esquerda e a esquerda promove os mesmos desmandos que a direita no país, talvez nunca tenhamos concordado sobre qualquer coisa’

Mariel Reis (marielreis@ig.com.br)

O Movimento Passe Livre bate em retirada. Em nota divulgada na imprensa, esclarece as razões de sua saída e justificam a sua presença nas manifestações. A motivação clara do movimento era a redução das tarifas dos transportes urbanos. Nada se falou na reestruturação do modelo implantado pelos governos nas cidades brasileiras. O que foi confirmado pela declaração à imprensa.

A saída do Movimento Passe Livre das manifestações nada tem com as incontáveis e pontuais violências contra alvos aleatórios, ataques que se voltavam contra a população, causando transtorno, pânico e medo, evitando uma adesão maior à sua causa. A alegação dos integrantes para a sua retirada é a de cenas de violência contra integrantes de partidos políticos que engrossavam a passeata, a maioria de esquerda, que segundo a afirmação do grupo, são também parte legítima das reivindicações. E, para um grupo apartidário seguem além, afirmando que o MPL é fruto das ambições desses partidos, reforçando que o caráter apartidário não é excludente, não é antipartidarista.

A violência lamentada volta-se apenas contra os manifestantes de esquerda atacados por outros indivíduos de militância e contra a violência do aparato policial na tentativa de repressão dos atos de vandalismo. Não há nada na exígua manifestação que faça menção a outras pautas como a PEC37, por exemplo, ou o combate pela moralização do país contra a corrupção. A saída do MPL de cena torna acéfalo o monstro criado nas ruas com passeatas que chegam a reunir populações de pequenas cidades ou países europeus. Entretanto, não é o que há de mais grave. O que há de grave é o alinhamento, não intencional ou inconsciente, político explicitado no conteúdo da afirmação, mostrando claramente que por trás de tudo não havia uma sociedade civil que se organizava e mobilizava, por vontade própria, pela simples exigência de seus direitos.

A frase “Essa é uma defesa histórica das organizações de esquerda, e é dessa história que o MPL faz parte e é fruto” não consegue soar além de um slogan político, endossando os partidos governamentais, servindo, no futuro, como jingle nas campanhas publicitárias de disputa aos cargos políticos nas esferas mais diversas. E quando se utiliza da ênfase, “ e é fruto”, confirma aquilo já dito em outro artigo de que toda a movimentação poderia ser apenas mais uma plataforma do PT como quando financia as ações do Movimento dos Sem Terra. Não foi à toa que Rui Falcão, dirigente do Partido dos Trabalhadores, colocou seu povo na rua na noite anterior.

O sonho acabou, quem não dormiu em spleepin-bag nem sequer sonhou, apregoava o compositor popular. Todos nós fomos contaminados pela esperança de que havia genuinidade nas motivações e, principalmente, autonomia, que as críticas se dirigiam as falências dos partidos e seu esvaziamento ideológico, mas tudo deu na mesma. O MPL falou, o MPL avisou “Essa é uma defesa histórica das organizações de esquerda”. Quem afirmará o contrário, se é a palavra do rei? Quem o fizer correrá o risco de piquetes em sua porta, coquetéis molotov e afins. Se o MPL representa a defesa histórica das organizações de esquerda e a esquerda promove os mesmos desmandos que a direita no país, talvez nunca tenhamos concordado sobre qualquer coisa como agora, por exemplo, em que ainda há tempo de ir aos jornais para afirmar que se trata de equívoco, burrice ou que algum secretário enviou para a imprensa o release errado porque desse forma o MPL ficará cada vez mais desacreditado.

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