Moacir C. Lopes

Eu, Mariel Reis, não sei orar. Apenas quando saio de casa, repito : Que Deus me guarde, que Deus me ilumine , que Deus me guie. E entrego o meu caminho as forças poderosas que regem o mundo. Moacir, faça de minha simples oração, à sua. Moacir C. Lopes que um cortejo de anjos marinheiros possa recebê-lo - corpo e alma - inteiro da aventura que foi existir. Vai, meu amigo, confidente e incentivador. Abaixo o que ele escreveu como pretenso prefácio para meu livro John Fante Trabalha no Esquimó.



Mariel Reis, novo Contista



É bom, e salutar para a literatura, podermos recepcionar um jovem escritor que surge com força e determinação como quem chega para incorporar-se de imediato ao patrimônio das letras nacionais.

É o caso de Mariel Reis que estréia com este livro de contos John Fante trabalha no Esquimó. Faz algum tempo venho acompanhando sua caminhada como contista, lendo contos esparsos, através dos caminhos do correio eletrônico, com surpresa pelas surpresas de seu estilo, de como conduz a narrativa, na primeira ou na terceira pessoa, com densa introspecção na corrente de pensamento dos personagens, captando as mínimas nuances de detalhes do ambiente em que transcorre a ação, e isto porque a maioria dos contos é narrada no tempo presente, e,simultaneamente, o que tais detalhes influenciam ou são influenciados pelo fator mental.

A maioria de seus personagens encontra-se nos limites da razão com a demência, como se a loucura fosse o estado natural das pessoas e a razão um mero ponto de referência sem significado.Mariel enreda seus personagens num fluxo de consciência que parece labirintos sem saída em que eles nem podem definir seus passos, o que há entre as amuradas, o que buscam, se a mulher que o homem procura está perdida nos mesmos labirintos, se ela existe, ou se ele mesmo existe, então também será o leitor envolto em mistérios que precisaria desvendar para autodefinir-se. O leitor passa a ser também responsável, como co-autor, pelo encadeamento do texto.

Seu estilo é farto em metáforas e outras figuras de linguagem, que enriquecem e dão brilho à narrativa, e prazer pela sua leitura. É também curioso como na maioria destes contos, como "Tropa de elite", "Estevão", "João", "Jonas, a Baleia" e vários outros, alguns com duas, três, quatro páginas, se desenvolve num único parágrafo, como se fosse a indicação para ser lido num único fôlego, seja sobre o instante de um ato ou um caldeamento de atos, o envolvimento de um ou mais de um personagem. "A visita", que abre o volume, com cerca de 10 páginas, de densidade psicológica, compõe-se de apenas dois parágrafos.


É vasto o universo dos temas aqui explorados. Desde o mais lírico, belo, humanista, na tessitura de "O pássaro", como num episódio de sexo animal em "A gorda", ou na linha de realismo mágico como em "Jonas, a Baleia" e "A boneca" e outros de semelhante linhagem, mas qualquer que seja o assunto, ele não foge ao seu estilo peculiar, carreado de figuras literárias que em muito enriquecem o texto, a exemplo de: "Ela levanta-se no labirinto de sombras – o quarto. A armadura de sua nudez choca-se com as formas pontiagudas da escuridão.", em "O labirinto"; "Já era tarde quando o demônio me confessou que repousava sobre o seu ombro esquerdo um homúnculo.", em "Por mil demônios"; "O homem que vende futuros acerta uma bolinha de papel em nossa direção. Antônio e eu paramos para apreciar sua arte em execução. E ele, depois de alguma concentração, arremessa inúmeras palavras no ar, como flechas que têm caminho certeiro até o coração, e, não se satisfazendo em tombá-lo, prefere alojá-las em nossas almas.", em "O homem que vendia futuros".

É esse universo criativo de Mariel Reis que estamos aplaudindo, esperando que venha a realizar bela e profícua carreira literária.


Moacir C. Lopes
junho de 2008



Comentários

Manoel Carlos disse…
Perdemos um amigo e uma referência literária.
Lembro-me de quando vocês se conheceram, acho que no restaurante do Largo do Machado.
Manoel Carlos

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