Adendo



A minha crítica em relação a discussão sobre a maioridade penal, enquanto não resolvemos outros problemas mais graves, permanece de pé. O que faremos se vencida a guerra? Adotaremos políticas ostensivas de ocupação, sim. Resgataremos o cidadão, seqüestrados pela horda de bandidos, devolvendo-lhe o direito de ir e vir garantia que o Estado democrático deve prover? Sim, também. Prenderemos, julgaremos e aprisionaremos os bandidos que restarem, procurando resgatá-los para que possam voltar à sociedade e desfrutarem de uma nova vida? Talvez.

Os preconceitos são muitos e, além disso, a maioria dos bandidos se acostumou com o lucro fácil, o dinheiro farto e as regalias. Como alguns de nossos políticos corruptos. Um fenômeno de espelhamento? Talvez também. O que faremos em relação à política das drogas. É, das drogas, porque esses traficantes não comercializam produtos eletrônicos, não pirateiam filmes nacionais ou estrangeiros ou mantém uma confecção para falsificação de roupas de grife. Não, os traficantes do Morro do Alemão ou de qualquer outro morro ou favela do Rio de Janeiro, vendem drogas.

Não será o momento de uma discussão séria com toda a sociedade, o Estado assumindo a parte que lhe cabe, para promovermos um debate sério sobre os rumos do consumo de drogas tanto em nosso Estado quanto no país? Não parecerá propício esse momento que alguma autoridade, sem hipocrisia, proponha uma solução que atenda às demandas de parte de uma população consumidora de estupefacientes? Não faço apologia sobre as drogas. A minha apologia é contra a violência decorrente dos confrontos de repressão ao comércio de tóxico no Brasil.

O dinheiro que se emprega em aparatos para essa guerra urbana poderia ser utilizado em outros setores. E a grana que resultasse da venda das drogas, taxadas, administradas com cuidado pelo Ministério da Saúde e suas respectivas secretárias, investigadas por órgãos competentes para que o andamento legal - caso a liberação fosse concluída como a melhor opção - não descambasse para um mercado negro tão nocivo quanto o modelo de tráfico de entorpecentes atual, acredito que metade dos problemas resolver-se-iam como por passe de mágica.

Essa guerra não pode ser encarada apenas como um problema social - traficantes armados comercializando drogas de um lado e policiais de outro. Mas como um desdobramento do capitalismo, na existência de um mercado consumidor, na especulação sobre o lucro ilícito, no enriquecimento de jovens de periferia que mudam meteoricamente o padrão de vida que possuem, passando a desfrutar do conforto da classe média.

Enfim, o bom e velho liberalismo.

Por que não angariá-lo para quem de fato é de direito? Quem? A própria classe média. Uma historieta somente para ilustrar. Eu estava em um evento na Zona Sul do Rio de Janeiro, quando o assunto se voltou para a favela da Rocinha, a venda de drogas e a violência na cidade. O cidadão ao meu lado, interferindo na conversa, simplesmente afirmou: "Não era para ter subido, ficar na mão daqueles negros. Antigamente a gente comprava na rua, um cara montado em uma moto bacana e..."

Tirem suas conclusões.

Comentários

Unknown disse…
Caro Mariel.
O título de seu texto deveria se chamar Marx na favela. E que importante ligação tem com o arigo publicado hoje no Globo do antropólogo Roberta da Matta.

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