A Pergunta


Uma dor de cabeça insistente atormentava Paul Valéry, que observava o Collège de France da janela de seu gabinete, sem preocupar-se, cofiando o bigode, buscava solucionar parte do mistério dos arcos da arquitetura do lugar.

A sineta das aulas não tardaria a tocar, porém custaria atendê-la, entretido como estava. Não era um relapso, não negligenciava suas funções, contudo não sentia a disposição necessária para explanar sobre qualquer coisa, posto que atormentado pela dor de cabeça.

O assunto sobre a vidência de Rimbaud também o esgotara, alinhou, não faz tanto tempo, um poema em que se perguntava: “Eu obedeço, talvez ao vidente?”. É certo que tratasse do vinho e seus efeitos, mas estaria esquivo da influência deste propósito?

A algazarra dos estudantes no corredor o importunava, tinha mania de silêncios, espreitando-os como se armasse emboscada para o mistério ocultado em suas dobras – um pássaro de reflexos e sóis ativos, pousados em seu braço fluido.

Recostava-se, a cadeira acomodava tão bem quanto um esquife, a escuridão do gabinete permitia o estudo das formas intrometidas na parede, com a luminosidade rara que partia da janela. As sombras, Valéry simplificou, porque essa é a missão do pensamento, tornar claras as coisas, sem que desçam ao ordinário, desvendar-lhes os claustros prenhes de significados.

Porque há uma secreta arquitetura que sustenta essa realidade de cinzas, com que chave acessá-la? .

Comentários

Márcio-André disse…
Salve, Mariel! Belíssimo. Abraços

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