Novas Notas
1.
Muitas das vezes transferimos os anseios errados para o nosso
trabalho. Em outras, quando não são os anseios, são as carências
que assumem o papel principal. Assumimos ideias sem prévia análise
de seu efeito; como também comportamentos sem levar em conta o
impacto deles em nossa vida profissional. E dependendo dos anseios e
das carências, encarnamos, em maior ou menor grau, o papel do herói
ou da heroína sem medir consequências. Colocamo-nos em risco. E o
risco assumido no trabalho deve ser calculado – senão restará ao
sujeito dois caminhos: a promoção ou a rua.
2.
Uma outra atitude, derivada do heroísmo, igualmente perigosa, é a
messiânica. Os heróis possuem identidades secretas, intercalam
entre uma e outra a sua atuação e, se são espertos, agem mais
vezes sem uniforme do que com ele, sendo discretos em suas
intervenções sem o extravagante de suas fantasias. O messiânico,
não. Ele não possui uma identidade secreta, não se importa com sua
exposição e nem com consequências. É o verdadeiro camicase da
vida empresarial. Muitas das vezes suas ideias fazem sentido e são
expostas com clareza e objetividade. Só há um problema: ele não
aceita sugestões. Não permite outras perspectivas. E o pior não
admite que pode estar errado.
3.
Em sua miopia, escapa ao indivíduo messiânico um detalhe: ele não
é o dono da empresa. Não pode reformá-la com o seu próprio
sacrifício e nem salvar a ninguém. Aliás, ninguém quer ser salvo
por ele; lhe dedicam sentimentos contraditórios: de solidariedade,
de pena ou de mofa. Às vezes passa despercebido, integrado ao
anedotário da firma e alijado de interação no setor em que está
lotado. No entanto, removê-lo do repertório que inventou para si é
penoso, porque a ele parece que querem confundi-lo, desestimulá-lo
ou anulá-lo. Ou tudo isso misturado. O que reforça sua obstinação
em vez de arrefecê-la.
4.
O messianismo, uma das heranças portuguesas, no Brasil, produziu em
Canudos, na figura do beato Antônio Conselheiro, uma representante
perigoso, cujo esmagamento, pelo exército, se deu em nossa república
nascente. Euclides da Cunha, escritor, em Os Sertões, escreveu sobre
o massacre do povoado e a resistência sertaneja. No mundo
empresarial, não ha lugar para tal coisa. E uma reforma – como
aquela motivada pela acusação de Conselheiro, a restauração
monárquica – ,não pode ser realizada apenas pelos heróis ou os
indivíduos messiânicos. É verdade que sem eles muitas das coisas
erradas talvez mudassem com maior lentidão, mas não se pode negar
seus equívocos.
5.
A mudança é uma construção de todos. Inclusive dos patrões. Sem
eles é inútil a luta – principalmente quando não se é o dono
dos meios de produção, conforme dito pelos marxistas. Não é
preciso sacrifício, mesmo quando se é o proprietário. Sem
indivíduos mascarados ou messianistas é mais fácil repartir a
verdade e o bom senso que não será monopólio de ninguém. E
sobrará mais tempo para todo mundo cuidar da própria vida e da
própria felicidade.
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