Perfis Brasileiros VI
Dedicado a Juju
Grete foi comprada numa loja de artigos usados. Era uma boneca em tamanho natural. Custou apenas quinze pratas. Estava entulhando a loja, segundo a vendedora, se tiver criança ela ficará feliz com o presente, finalizou. Pegou o dinheiro. Como se tivesse esquecido algo, voltou para perguntar se queria que embrulhasse, disse que não, levaria para casa assim mesmo. Chamei um táxi. Não poderia ir de ônibus para casa, talvez estranhassem. O taxista não se mostrou surpreso, indicou que a corrida com aquela bagagem teria um acréscimo no valor : dez por cento sobre o preço da bandeirada. Senti que me roubava, mas não me arrisquei a arrumar confusão. Durante todo o caminho espiava meu comportamento, talvez não compreendesse minha solidão, estranhava minha relutância em chamar uma prostituta ou procurar uma guria para casar, afinal eu era novo, tinha boa aparência, conforme notava o taxista pelo retrovisor. Não dei importância, só queria chegar logo, Grete não mostrava sinal de indisposição, a longa viagem até minha casa não alterava seu ânimo, mantinha-se na mesma posição dentro do carro : as pernas juntas, as mãos pousadas sobre o joelho. Não desgrudei os olhos de suas pernas. Ela parecia perceber e não se importar. O taxista ligou o rádio. Noticiário. É bom saber das coisas, disse. Já não ligava para a anormalidade da situação. Quando senti a mão de Grete escorregar pela minha perna. Não sabia se por descuido ou intencional, mas não me descontrolei. Mantive minha serenidade. O taxista parecia ter percebido, perguntou se estava tudo bem. Disse a ele que não se preocupasse, era apenas um mal estar passageiro. Grete desta vez jogou todo o corpo para cima de mim, talvez a curva tenha ajudado, o taxista se desculpou, procurei endireitá-la, ela não opôs resistência, mas seus olhos mostravam contrariedade, começou a mover os pés, o barulho cada vez maior, incomodava, o motorista diminuiu o volume do rádio, parecia desconfiado. Vou encostar, disse. Você está drogado rapaz?. Não levo gente dopada nesse carro, pode procurar outro. Desci do táxi. Grete se recusava. Não se movia. Ela não quer sair, eu disse. Trata de arrancar essa piranha daí, explodiu o taxista. Não gostei do modo como ele se referiu a ela. Grete se ressentiu. Levantou-se. Dá o fora, piranha!, vociferou o motorista. A situação fugia do controle. Não vou voltar para a loja de artigos usados, eu não vou voltar, disse. Puxou uma arma de brinquedo da cintura. Apertou o gatilho. Saiu a bandeirinha com a palavra bang – disparou contra a solidão.
Grete foi comprada numa loja de artigos usados. Era uma boneca em tamanho natural. Custou apenas quinze pratas. Estava entulhando a loja, segundo a vendedora, se tiver criança ela ficará feliz com o presente, finalizou. Pegou o dinheiro. Como se tivesse esquecido algo, voltou para perguntar se queria que embrulhasse, disse que não, levaria para casa assim mesmo. Chamei um táxi. Não poderia ir de ônibus para casa, talvez estranhassem. O taxista não se mostrou surpreso, indicou que a corrida com aquela bagagem teria um acréscimo no valor : dez por cento sobre o preço da bandeirada. Senti que me roubava, mas não me arrisquei a arrumar confusão. Durante todo o caminho espiava meu comportamento, talvez não compreendesse minha solidão, estranhava minha relutância em chamar uma prostituta ou procurar uma guria para casar, afinal eu era novo, tinha boa aparência, conforme notava o taxista pelo retrovisor. Não dei importância, só queria chegar logo, Grete não mostrava sinal de indisposição, a longa viagem até minha casa não alterava seu ânimo, mantinha-se na mesma posição dentro do carro : as pernas juntas, as mãos pousadas sobre o joelho. Não desgrudei os olhos de suas pernas. Ela parecia perceber e não se importar. O taxista ligou o rádio. Noticiário. É bom saber das coisas, disse. Já não ligava para a anormalidade da situação. Quando senti a mão de Grete escorregar pela minha perna. Não sabia se por descuido ou intencional, mas não me descontrolei. Mantive minha serenidade. O taxista parecia ter percebido, perguntou se estava tudo bem. Disse a ele que não se preocupasse, era apenas um mal estar passageiro. Grete desta vez jogou todo o corpo para cima de mim, talvez a curva tenha ajudado, o taxista se desculpou, procurei endireitá-la, ela não opôs resistência, mas seus olhos mostravam contrariedade, começou a mover os pés, o barulho cada vez maior, incomodava, o motorista diminuiu o volume do rádio, parecia desconfiado. Vou encostar, disse. Você está drogado rapaz?. Não levo gente dopada nesse carro, pode procurar outro. Desci do táxi. Grete se recusava. Não se movia. Ela não quer sair, eu disse. Trata de arrancar essa piranha daí, explodiu o taxista. Não gostei do modo como ele se referiu a ela. Grete se ressentiu. Levantou-se. Dá o fora, piranha!, vociferou o motorista. A situação fugia do controle. Não vou voltar para a loja de artigos usados, eu não vou voltar, disse. Puxou uma arma de brinquedo da cintura. Apertou o gatilho. Saiu a bandeirinha com a palavra bang – disparou contra a solidão.
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