*Apresentação Para o Livro Exercício de Garça
A multiplicidade de vozes da poesia contemporânea tem gerado os mais diferentes resultados. E os poetas, atingindo uma perfeição artesanal de causar inveja a qualquer parnasiano. E nesse caldo pós - moderno, temos uma variável que nem sempre é levada em consideração no julgamento da poesia hoje: é de que ela está desaparecida da maioria dos poemas lidos por mim ultimamente.O que não quer constituir um juízo de valor, mas, afeta diretamente aquilo que chamo de empatia com o que se está lendo. Todos conhecem de cor e salteado a cartilha, sabem fazer sonetos, glorificam João Cabral de Mello Neto, participam de fóruns, contudo a essência do que escrevem não participa do humano que constitui e colabora para nosso aperfeiçoamento. Não comove.
Quando me chamaram para a apresentação do livro de Cláudio Alves, exultei por conhecê-lo pessoalmente, e depois pela qualidade do manuscrito lido por mim. E me prontifiquei em entregar o mais rápido possível minha impressão. E foi a melhor. Porque lendo as peças que compõem o grande poema ecológico que intitula o livro, notei que nele há, além das qualidades de carpintaria necessárias ao ofício, coisa de que não duvido ter o poeta, a lembrança dos grandes haicais, e da pintura oriental, onde são recorrentes imagens de tanta delicadeza e pungência como as que habitam o longo poema que descreve a vinda das garças para a aldeia de Cláudio e como elas vêem os homens. E a progressão de uma relação que põe em cheque a evolução dos centros urbanos e a degradação do meio onde habitam do qual esse urubu branco é o presenciador e anunciador de algo que está se quebrando e se perdendo dentro e fora de nós.
As garças de Cláudio, comparadas com o boi de Carlos Drummond de Andrade, observam os homens. Na sua dor e na sua patética tentativa de apreender o significado dos nossos gestos, que se fogem a compreensão dos animais, ganham contorno de uma sessão de tortura por querer arrancar de dentro de nós aquela simplicidade esquecida, e a antiga comunhão que tínhamos com a natureza. Quando formávamos um só corpo e o planeta era nossa única casa.
Cláudio Alves alinhava todos esses crimes que os seres de almas sensíveis tem medo de olhar de frente, porque estão desnudados ali, naqueles versos, por aqueles bicos, que descarnam nosso esqueleto diante de uma verdade que o rio sussurra em segredo àquelas aves, que os homens passarão e elas passarinham.
* Escrevi o texto de apresentação para o livro – samurai Exercício de Garça, Cláudio Alves
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