Meu Encontro com Ivan Lessa
No calçadão de Ipanema vejo Ivan Lessa – está na companhia de dois outros senhores de idade que só depois reconheço – Ziraldo e Jaguar. É a primeira vez que os avisto juntos, conversando, exercendo a bundologia – arte caríssima ao grupo que dedica a ela boa parte do tempo em que atravessa a faixa da calçada, inspecionando as virtudes das beldades, comentando entre si as riquezas naturais de nossa cidade tão cara ao olhar turístico desse quase inglês: Ivan Lessa.
Ivan Lessa vive na terra da Rainha, como gosta de dizer. É quase brasileiro quando está entre nós, frisando com isso que ainda mantém certa distância da assoladora síndrome de vira – lata que acomete a todos os seres viventes do terceiro mundo. Não sente a mínima necessidade de escrever, ressalta que é quase um acidente e aqueles que não descobrem em seus livros verdades tão profundas quanto as escritas por Proust podem esquecê-lo, porque não o merecem.
A minha aproximação não foi das melhores. Evocando minhas memórias sobre o Menino Maluquinho, as tiras do Jaguar e os livros do Ivan. Não precisa fazer média, é só ficar calado enquanto conjeturamos sobre os problemas transcendentais da velhice quando esta se depara diante de uma gostosa dessas. Aponta uma mulher que hipnotiza o grupo. Ziraldo solta que nunca na hora H falhou. Ivan Lessa emenda que o Saci é muito seu amigo e ótimo jogador de gamão.
O que você faz? Lessa me pergunta. Sou um curioso. Não perde a oportunidade de me sacanear com aquela pegadinha manjada sobre a curiosidade. Quem mandou ser ingênuo? Tento costurar a resposta, o soneto fica pioradíssimo e desconcentro os cavalheiros que investigam certa passante com uma gargantilha. Impressionante como estão evoluídos, em outra época e com mais bebida demoraria a desconfiar que estivesse levando gato por lebre – nisto todos concordam e sentenciam maldita a medicina estética que contraria as ações da natureza, subvertendo-a.
Pergunto ao Ivan se devo escrever como aconselhava o Flaubert, se acreditava na crença do sofrimento do escritor e outros babaquices. Ele taxativo mirou bem com as palavras e me fuzilou: "Vai querer escrever com uma bonequinha travada? Cheia de questões mal resolvidas? É melhor procurar um analista e não alugar os outros com queixas e mau humor" "tenha um pingo de consideração pelo infeliz que irá ler a merda que você escreveu. Seja irônico, tenha humor, mas não pense em fazer alta literatura, pelo amor de deus! Se acontecer foi um acidente feliz, não?". Ouvi uma verdade, me despedi dos três, perguntei se tinha e-mail. "Eu até tenho, mas prefiro cartas. Sou um cara antigo. Prefiro a nostalgia". Pegou um pedaço de papel de maço de cigarros me dando o endereço de sua residência. Não me prometeu resposta as cartas, porque não era babá de marmanjo e não tinha dom professoral.
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