Em Nome do Pai?



Durante a reunião com a vereadora Rosa Fernandes, que discorria sobre o projeto Bairro Maravilha, estendido até Pavuna, sobre os impactos da ação da Prefeitura na região, de suas intervenções na fiscalização das obras realizadas nas adjacências, frisando que sua obrigação em mandato como vereadora era esta – estar nas ruas, fiscalizar e cobrar resultados de políticas localizadas. O assunto resvalou para a Lona Cultural Jovelina Pérola Negra.

A reunião desencadeou uma série de perguntas, respondidas com máxima sinceridade pela vereadora. E, talvez a mais séria delas, partiu de uma moradora que queria saber quem era o pai da criança, quando inquiriu: “- Foi você, Rosa, quem trouxe à Lona?” A vereadora Rosa Fernandes munida com a franqueza que lhe é característica, não titubeou e deu resposta correta ao questionamento, esclarecendo que a Lona era requisição de um grupo na Pavuna – subentenda-se Grupo Cultural Na Pavuna : Marko Andrade, Namay Mendes e Mariel Reis - juntamente com a ex- Secretária de Cultura Jandira Feghali. Isto poderia ter colocado a coisa em seu devido lugar, caso a inquiridora não saísse dali com a pulga atrás da orelha, julgando tratar-se de modéstia da vereadora, que se eximiu de ser a autora da Lona Cultural Jovelina Pérola Negra.

Rosa Fernandes disse a verdade. Entretanto, a sociedade civil depois de anos de desarticulação, perdeu a crença de que pode mobilizar-se em prol de mudanças em sua situação sócio-política e, quiçá, econômica. A ditadura foi diretamente culpada na desarticulação da sociedade civil com seus desmandos, implantando uma sociedade do medo, seqüestrada de si mesma, amedrontada em suas convicções e castrada em seus desejos. Não lhe faltavam razões: exílio, tortura e morte.

Na longa duração dessa noite, políticos populistas incrustaram seu império, realizando aquilo que por direito pertencia à esta sociedade, arrogavam-se porta-vozes das vontades populares, e à sua moda, com bem ensinou certa filosofia, roubava-se, mas se fazia. E tínhamos a quem agradecer por ver nossas aspirações materializadas. O tal pai. E em nome do pai, pedíamos. E rumávamos para agradecê-lo, beijar-lhe as mãos, prostrar-nos diante dele como de um ídolo. Portanto, a autora da pergunta, incitada por esses anos de evasão de sua própria vontade, quis ter os nomes dos bois, enfim, quis saber o nome do pai da criança. Não é propriamente culpa dela, mas de um contexto de alienação que submeteu todo o brasileiro com mais de cinqüenta anos.

A nossa sorte é que nossa reeducação não tardaria. Através das minorias, que decidiram buscar sua liberdade civil, foi apontado o caminho de volta às reivindicações. A maior delas mesmo ocorre nas fuças da cidade e não é organizada por políticos, mas por indivíduos que se afinizam por suas escolhas sexuais e resolveram expor sua indignação diante de tanta injustiça e incompreensão e, sobretudo, de violência. Não apenas eles organizaram-se; outro exemplo é a Marcha da Maconha em que usuários de diversas classes sociais aderiram à idéia de descriminalização. Outros resolveram engrossar o coro da liberação. Tanto que até um ex- presidente juntou-se a causa.

Estes exemplos que reuni, servem para ilustrar a mobilização da sociedade civil em torno de seus interesses. E não estou aqui para julgar a legitimidade de cada um deles, mas para mostrar que é possível organizar-se e lutar pelo que se acredita, sem a necessidade da figura de um pai para conceber pelo que se luta ou a maneira como se deverá lutar. A luta é uma concepção que nascerá de cada vontade, da necessidade de cada homem e do desejo de cada um de nós em tornar a sociedade cada vez mais tolerante e justa e avançar, de fato, no Estado democrático.

À senhora que perguntou quem é o Pai, respondo com simplicidade: somos nós todos que sonhamos com algo melhor para esse bairro; para esta região, marcada apenas pela violência e suas conseqüências danosas, que salta às páginas policiais e aos noticiários de crime. No entanto, se exercermos nossa cidadania, se lutarmos por espaços de democracia, alteraremos essa paisagem desértica que aí está para outra, mais verdejante e esperançosa.

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