Práticas Marginais
O alterocopismo é uma prática assídua realizada durante três dias –
sempre aos fins de semana - por praticantes saudáveis ou os atletas mais
fanáticos não se limitam ao curto período de três dias para o exercício dos
membros superiores e alteração dos sentidos provocados como colateralidade da
manutenção psíquica e corporal: alongam durante toda a semana a sequência
executada nos três dias por atletas sem afinco à sua obsessão.
Nas sextas-feiras, em que o levantamento de copo goza de uma
popularidade tremenda nos bares, nos botequins, nos restaurantes, nas
lanchonetes, nas padarias; com ruidosa alegria, o esporte, praticado tanto em
equipes quanto individualmente, eleva-se à categoria olímpica. Geralmente, o
leitor - nessa altura do campeonato, depois da descrição de um desporto
marginalizado, repleto de calúnias, vilão do excesso de peso, de cardiopatias e
outros males -, deve-se perguntar – é o
meu bordão, prefiro-o ao baixo calão – diabos onde o cronista quer chegar?
Ao pecado da inveja – capital, martirizante, solitário e envenenador do
espírito.
Explico: após grave problema de
saúde tornei-me um desportista xiita, sem a benesse do álcool. Glória a Deus. Nas minhas caminhadas,
principalmente, as tentações surgem – sinto-me um santo em provação num deserto
-, mas sem um hagiógrafo para registrá-las para a posteridade ou um eclesiástico
para o estudo de minha martirologia. Portanto, meu leitor, após a confissão de
que a geladinha – coisa do demônio! vade
de retro! – era uma fraqueza, você pode concluir a triste humanidade do
atleta de fim de semana que se quer impoluto fisicamente – gostaram do impoluto? – mas sente-se terrivelmente arrastado para
os prazeres mundanos.
A concentração em um objetivo e
o sentido de todo o esforço acodem-me sempre que a debilitação quer ganhar o
combate. Não me tomem como o rato Mestre
Splinter, de Tartarugas Ninjas, com uma vontade inquebrantável, porque não
corresponde a realidade. Termino sempre invadido por uma suave tristeza sem um pit stop da socialização, reinventando-a
– a tristeza – noutras atividades para a saciedade do vazio dos antigos
hábitos. A caminhada é uma forma de autoiluminação – acesa enquanto há fricção
dos pés – quando cessada a atividade, resta na consciência uma centelha para
iluminá-la inteira, livrando-a dos iminentes perigos dos hábitos de Circe – gastei, leitor, acostume-se...
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