A Minha Nova Roupa - Marca Calibán
Minha mulher me liga: "Não vai postar nada sobre a assinatura de contrato com a editora?", respondo: "Ainda não estou refeito dessa atitude".
Desde a entrega do contrato, me sinto meio castrado. Um pensamento invade a minha cabeça: "Entrei no jogo. Serei eu mais um vendido???". Isso me preocupa e aborrece. A editora é ótima, cuidadosa e me dispensou uma atenção incomum.
Claro, tem os detalhes. No primeiro contrato, o que não assinei, me pagaria com 100 exemplares do livro. O que eu vou fazer com cem exemplares? Meu apê é mínimo, tem um "cachorro-cupim" e uma promissora artista plástica de 5 anos de idade - que acha que qualquer aglomerado de celulose seco é uma excelente plataforma para sua criatividade. "Não tenho um lugar seguro para eles" - grunhi.
Não tenho um pingo de talento para comercializá-los. Nem pensar.
Decidi chiar.
Poderia vendê-los de porta em porta como os antigos vendedores de enciclopédia, mas esbarro outra vez com a inimizade do tempo – correndo sempre contra nós, a humanidade. Então, fiz uma exigência. Pedi uma grana razoável. Suficiente para pagar uma conta de luz e outra de telefone. Talvez uma média e um pãozinho, ao fim de alguns meses.
Vai o novo autor falar em grana! Quase fui enforcado e esquartejado. Cometi o pecado original, com a expulsão do paraíso decretada. Os anjos prestes a me enxotarem do Éden, quando uma voz distante, forte, soou: "Pode deixá-lo". O anjo partiu triste, com sua espada inútil pendurada à cintura. Deus falou que aceitaria minha proposta, isto quer dizer, o editor, mas que não abusasse de sua boa vontade. Aceitaria ceder – me, pela metade. Estava em um excelente dia, que minha intransigência não estragasse tudo.
O segundo contrato chegou. Sua aparência era melhor, não rosnou, nem quis mijar nas pernas de minha calça. Desconfiei do comportamento desse pitbull e convoquei alguns amigos para matar a charada e, para minha sorte, formou-se uma junta investigativa que descobriu que haviam alterado o humor do pobre animal e sua mansidão era uma contrariedade à natureza. Os alertas vieram de todos os lados, seria perigoso, mas se eu recusasse nunca faria essa viagem a terra desconhecida do livro publicado sem um tostão do autor, simplesmente porque alguém em algum lugar gostou do que você escreveu e decidiu apostar em sua loucura. Fechei os olhos e entrei no trem fantasma, correndo o risco da tripulação que acabou encenando eternamente a Caverna do Dragão, mas viver é perigoso. Disse um autor afamado e com muito mais talento e estrada que eu. A minha ambição era ser um escritor underground, publicado alternativamente, mas ser alternativo custa caro, cinco mil reais – a impressão do livro – fora as parafernálias acessórias: capista, revisor e outros adereços nesse carnaval que é uma publicação. A minha situação não me permite brincar mais no salão, minha grana é toda investida em aluguel, pagamento de contas diversas e quando vejo o que resta para o mísero autor dessas linhas é desanimador, constrangedor e aviltante. A graça divina não me permitiu morrer de fome, porque sei dar meus pulinhos e tenho uma esposa que bota fé e corre atrás juntinho, caso contrário, tudo iria por água abaixo e a ponte seria o meu endereço mais próximo – isso se ela não estivesse ocupada por outro com igual sorte e sina.
Meus amores donos de gráficas permitam o sonho do livro alternativo, impresso pelo autor, em edição especialmente cuidada, quase artesanal, porque se isso não ocorrer, palavras como autor e marginalidade estarão em desquite para sempre. Com essa separação podem se dar muitas mortes – talvez de coisas imprescindíveis para a cultura brasileira. Vendido? Vendido, sim. Agora quero ser vendido em banca de jornal, em sex shop, em camelô – taí uma idéia, porque não incentivar esse tipo de mercadoria para nossos ambulantes? - em saunas gays ou não, me programas de auditório, em casas de massagem, em termas, em igrejas, em templos de umbanda e candomblé, em templos kardecistas e evangélicos e principalmente nas livrarias mais próximas de sua casa para que você me ajude comprando o livro, para que não seja um fracasso editorial de cara.
Deixemos ao menos o feto respirar antes de matá-lo. Permaneço acreditando na grande literatura, enquanto a minha é feita de matéria comezinha. E ainda vou emplacar o livro alternativo – Contos Rejeitados – esse não me sai da cabeça, projeto feito pelo Alessandro Garcia com supervisão de vários amigos que lêem e discutem as intenções desse micro livro composto de uma novela e três contos. É preciso resistência se não quiser deixar a bancar quebrar. Minha mulher está certa. Não vou soltar fogos, não é para tanto. Mas, divido com os leitores essa minha alegria ou como prefiro essa minha preocupação a menos.
Aguardem notícias.
Desde a entrega do contrato, me sinto meio castrado. Um pensamento invade a minha cabeça: "Entrei no jogo. Serei eu mais um vendido???". Isso me preocupa e aborrece. A editora é ótima, cuidadosa e me dispensou uma atenção incomum.
Claro, tem os detalhes. No primeiro contrato, o que não assinei, me pagaria com 100 exemplares do livro. O que eu vou fazer com cem exemplares? Meu apê é mínimo, tem um "cachorro-cupim" e uma promissora artista plástica de 5 anos de idade - que acha que qualquer aglomerado de celulose seco é uma excelente plataforma para sua criatividade. "Não tenho um lugar seguro para eles" - grunhi.
Não tenho um pingo de talento para comercializá-los. Nem pensar.
Decidi chiar.
Poderia vendê-los de porta em porta como os antigos vendedores de enciclopédia, mas esbarro outra vez com a inimizade do tempo – correndo sempre contra nós, a humanidade. Então, fiz uma exigência. Pedi uma grana razoável. Suficiente para pagar uma conta de luz e outra de telefone. Talvez uma média e um pãozinho, ao fim de alguns meses.
Vai o novo autor falar em grana! Quase fui enforcado e esquartejado. Cometi o pecado original, com a expulsão do paraíso decretada. Os anjos prestes a me enxotarem do Éden, quando uma voz distante, forte, soou: "Pode deixá-lo". O anjo partiu triste, com sua espada inútil pendurada à cintura. Deus falou que aceitaria minha proposta, isto quer dizer, o editor, mas que não abusasse de sua boa vontade. Aceitaria ceder – me, pela metade. Estava em um excelente dia, que minha intransigência não estragasse tudo.
O segundo contrato chegou. Sua aparência era melhor, não rosnou, nem quis mijar nas pernas de minha calça. Desconfiei do comportamento desse pitbull e convoquei alguns amigos para matar a charada e, para minha sorte, formou-se uma junta investigativa que descobriu que haviam alterado o humor do pobre animal e sua mansidão era uma contrariedade à natureza. Os alertas vieram de todos os lados, seria perigoso, mas se eu recusasse nunca faria essa viagem a terra desconhecida do livro publicado sem um tostão do autor, simplesmente porque alguém em algum lugar gostou do que você escreveu e decidiu apostar em sua loucura. Fechei os olhos e entrei no trem fantasma, correndo o risco da tripulação que acabou encenando eternamente a Caverna do Dragão, mas viver é perigoso. Disse um autor afamado e com muito mais talento e estrada que eu. A minha ambição era ser um escritor underground, publicado alternativamente, mas ser alternativo custa caro, cinco mil reais – a impressão do livro – fora as parafernálias acessórias: capista, revisor e outros adereços nesse carnaval que é uma publicação. A minha situação não me permite brincar mais no salão, minha grana é toda investida em aluguel, pagamento de contas diversas e quando vejo o que resta para o mísero autor dessas linhas é desanimador, constrangedor e aviltante. A graça divina não me permitiu morrer de fome, porque sei dar meus pulinhos e tenho uma esposa que bota fé e corre atrás juntinho, caso contrário, tudo iria por água abaixo e a ponte seria o meu endereço mais próximo – isso se ela não estivesse ocupada por outro com igual sorte e sina.
Meus amores donos de gráficas permitam o sonho do livro alternativo, impresso pelo autor, em edição especialmente cuidada, quase artesanal, porque se isso não ocorrer, palavras como autor e marginalidade estarão em desquite para sempre. Com essa separação podem se dar muitas mortes – talvez de coisas imprescindíveis para a cultura brasileira. Vendido? Vendido, sim. Agora quero ser vendido em banca de jornal, em sex shop, em camelô – taí uma idéia, porque não incentivar esse tipo de mercadoria para nossos ambulantes? - em saunas gays ou não, me programas de auditório, em casas de massagem, em termas, em igrejas, em templos de umbanda e candomblé, em templos kardecistas e evangélicos e principalmente nas livrarias mais próximas de sua casa para que você me ajude comprando o livro, para que não seja um fracasso editorial de cara.
Deixemos ao menos o feto respirar antes de matá-lo. Permaneço acreditando na grande literatura, enquanto a minha é feita de matéria comezinha. E ainda vou emplacar o livro alternativo – Contos Rejeitados – esse não me sai da cabeça, projeto feito pelo Alessandro Garcia com supervisão de vários amigos que lêem e discutem as intenções desse micro livro composto de uma novela e três contos. É preciso resistência se não quiser deixar a bancar quebrar. Minha mulher está certa. Não vou soltar fogos, não é para tanto. Mas, divido com os leitores essa minha alegria ou como prefiro essa minha preocupação a menos.
Aguardem notícias.
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