Sobre o Dia dos Namorados

"Crescei-vos e Multiplicai-vos"
"Quem paga as fraldas?" argumentou outra voz.
O homem faz escolhas. E nem sempre consegue explicar as escolhas que faz de maneira clara e racional, porque nela estão presentes componentes os mais diversos: sociais, econômicos, culturais e biológicos. Talvez a vida tenha se pautado dessa forma para selecionar aqueles que estão mais aptos a se desenvolverem em ambientes inóspitos, muitas das vezes desfavoráveis à instalação humana. Chamam a essa capacidade de instinto, e, ele contribui para que a espécie humana venha cada vez mais se adaptando as necessidades do planeta e dela própria.

Nossas escolhas influenciam o nosso modo de ver as situações em que estamos envolvidos – com pessimismo ou otimismo. Faz com que nosso cérebro funcione, examinando a melhor maneira de administrar recursos, recorrer a alianças, romper acordos. Em suma, nossa escolha decide se estaremos vivendo tempos de paz ou tempos de guerra.

A natureza dotou as mulheres dessa intuição de que é portadora quando ela escolhe o macho para reprodução. Este deverá estar apto para suprir as necessidades da prole faminta: caçando, pescando, encontrando abrigo do tempo. Para isso a mulher escolhe aquele individuo que mais se encaixe nessas qualidades e se une a ele para formarem um núcleo familiar e dar continuidade à espécie.

Nos dias dos namorados eu tentei seguir o curso invectivado pela natureza, não tive sorte. Porque nos tempos modernos, o problema populacional se juntou a outro de ordem econômica, isto dificultou minha intenção guiada por um pedido de minha filha que desejou um irmão para o dia dos namorados. Não seria no Natal, perguntei. Ela desconversou indo para perto de suas bonecas, ligando o fogão de mentirinha e folheando o jornal de sua idade: o gibi da Mônica.

O que fiz: simplesmente dei cabo do estoque de preservativos da casa. Seguro das minhas origens evolutivas e da necessidade de procriação, reservei para a noite dos dias dos namorados toda a carga instintiva da reprodução. Comecei o ritual de acasalamento, sempre tendo o foco de dar um presente a minha filha, um aborrecimento para minha mulher e um novo encargo econômico para mim. Não importa. Fiz minha escolha, caceteei a minha mulher sobre a abdução dos preservativos e acusei, injustamente, meu cachorro como o responsável dessa iniciativa, porque até aquele momento ela não levava em conta o pedido de minha filha, e, não somava a isto minha objeção em usar preservativo nessa noite tão especial. Minha esposa, dotada da sabedoria que a natureza se utilizou para trazer os homens das cavernas aos edifícios, negou-se a experiência; invoquei os evangelhos, “crescei-vos e multiplicai-vos “ nem isso se mostrou capaz de convencê-la a compartilhar de meus intentos.

Os artifícios românticos todos foram utilizados como armas otimizadoras para a conjunção, mas nenhum deles se mostrou suficiente para seduzi-la e levá-la a aceitar minha proposta naquela noite. Então, impaciente, desejando uma explicação sobre minha recusa ao uso dos preservativos, revelei o inocente pedido de minha filha: um irmãozinho. E, sem medo, afirmei meu engajamento na missão de consegui-lo mesmo que me custasse noite insone e queixas sobre ciclo menstrual.

Ela indignou-se. Porque havia planejado uma volta ao redor do nosso quarto, atualizando de forma erótica esse clássico de língua inglesa, enquanto que meu comportamento era o de um protestante, querendo apenas o sexo como uma forma de reprodução, seduzido pela idéia maravilhoso de perpetuar meus genes rebeldes. Frustrou-se tanto que quando nos decidimos entender faltou a ela o ímpeto natural do embate amoroso, perguntando-se o que se passava na minha cabeça maluca para resistir daquele modo ao uso do preservativo – nesta altura do campeonato, vencido pelo desejo e pelo cansaço, resignei-me a trair a vontade de minha filha, caindo no fragor da batalha.

Eu fiz minha escolha. Todos que me conhecem sabem qual foi. Aurea , Isabelle e Menelau também.

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