Cartas Fracassadas
Caro
Luciano Huck,
A
carta vai algo comovida. O serviço realizado pelo quadro “Lar Doce
Lar” é, sem dúvida, um dos momentos mais impressionantes da
televisão brasileira, pela atenção, o tratamento e a realização
da recuperação das casas dos telespectadores envolvidos, porque
muitas das vezes suas histórias estão ligadas indissoluvelmente ao
espaço físico onde habitam e recuperá-lo é, de certa forma,
resgatar parte de uma história de felicidade – isto que pouco está
presente na realidade brasileira, cercada por escândalos, falcatruas
e maracutaias.
Feito
o preâmbulo, Luciano, estou enviando as fotos da casa de minha mãe,
moradora do bairro da Pavuna, que desejo inscrever para concorrer a
reforma e à disposição de nova mobília. Ela, minha mãe, mora com
dez pessoas na casa, ainda com telhas de amianto, com goteiras, em um
estado dá causar pena. Meus irmãos não conseguem trabalho formal,
vivem de biscates, mas não caíram na marginalidade. O que é uma
sorte.
Sou
o mais velho, Mariel Reis, cursei o curso universitário, mas tive de
interrompê-lo*, para trabalhar, ajudando a custear o alimento dos
meus outros irmãos ainda sem condições para arranjar ocupação.
Minha mãe sempre tentou nos ajudar na medida do possível, com
aquilo que conseguia, fazendo unha para fora, assando bolos,
realizando faxinas – nisto, algumas vezes, eu mesmo a acompanhava.
Mas
a missão de alimentar as dez bocas, vesti-las e calçá-las; pouco
ou mesmo nada sobrando, seja para ela, minha mãe, ou para a
preocupação em reformar a casa. Quando tomei contato com o
programa, não tive dúvidas, pedi a Deus que me inspirasse uma carta
sincera, sem o intuito de me aproveitar da bondade de quem quer que
fosse; uma carta honesta para enviar até à sua produção.
Querido
Luciano, só há um porém em tudo isso, não falo com minha mãe um
bom período, o que torna o meu pedido também sigiloso, porque caso
a carta seja acolhida, com prazer gravarei depoimento ou o que quer
que seja para o andamento ou aprovação do desejo desse filho
distante: a reforma da casa de sua mãe. Porque acima das desavenças
deve estar o amor ao próximo e àquela que nos gerou e merece certo
conforto durante os restos dos dias que ainda têm conosco, mesmo que
sob minha vigilância discreta e distante.
Conforme
disse, aquilo que posso fazer de modo discreto, eu o faço. Paguei
para meu irmão um curso de cabeleireiro, estou juntando dinheiro
para propiciar aos demais um curso profissionalizante onde suas
vocações possam encontrar recreio. A minha dificuldade é estar só
e ser só, porque muitos se levantam para criticar, humilhar e
ofender, mas poucos erguem a mão para salvar. Tenho minhas
limitações, porque hoje tenho uma família, compromisso que me
impede de atos maiores e generosos.
Os
nomes dos meus irmãos são, a começar por mim: Mariel, Marielson,
Marise, Marcio, Michael, Marlon, Maysa, Mayara, Marilson e Joseane. A
residência deles, situa-se à Rua Praça Ênio, XX Pavuna – Fundos
– Rio de Janeiro/RJ – Cep: 21420-000.
Eu
me chamo Mariel Reis, morador de Bonsucesso, à Avenida Teixeira de
Castro, XX/XXX – Cep: 21040115, posso ser encontrado nos telefones
(XX) XXXX – XXXX/(XX) XXXX – XXXX/ (XX) XXXX-XXXX. Qualquer outra
informação estou disponível para fornecer.
Volto
a reiterar a natureza dessa carta, comovida. Procurei narrar de modo
honesto, sem a comoção demasiada, mas com a verdade em mente para
que isto toque a você e à sua produção na escolha desse meu Lar
Doce Lar, do qual ando distante, mas que pelo qual zelo dentro do
limite de minhas forças.
*
Carreira retomada
04/2009
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