Impressões sobre o conto O Olhar da Bissetriz
Meu Caro Irmão Anderson,
Embora não seja habitual minha manifestação acerca do que leio através de carta não posso furtar-me da utilização de meio tão arcaico para transmitir as impressões exatas que me sobrepujaram após a leitura de seu trabalho, acertadamente o conto “O Olhar da Bissetriz”. Este de uma execução atilada sob a perspectiva que você resolveu adotar para nortear sua criação do livro homônimo – isto se não encontrou outro nome para batizá-lo, enquanto repousava nesta outra plaga, embalado pelo ciciar dos coqueiros e da melíflua voz de mulher amada – retomo depois de minha divagação, a perspectiva do duplo. É certo que deve ter notado que me faço opinar semelhantemente a natureza formal do conto: uma epístola.
Este condicionamento já o posiciona modernamente entre os gêneros caros ao pós-modernismo que se valeu dessas formas para elevá-las em seus status à categoria de alta literatura. O pós-modernismo é um blefe, porque tal procedimento já pode ser detectado em obras de raríssimo lavor no século XIX em autores do romantismo alemão. Em nada essa minha observação empana o brilho do método sobre o qual se arquitetou para inserir o espírito narrativo em uma forma em que a verossimilhança não saísse prejudicada do embate. E o leitor conservasse aceso o pacto de ilusão tão caro à literatura de qualidade em produção por você e ligada à temática que não se descola de todo do período literário aludido. Tendo-o mesmo transpassado e transladado para outros países, apegada ao imaginário de um sósia, errante desgarrado e até aferrado à ciência com seus clones, migrados para os produtos de tevê como a novela de Glória Perez que contava com Murilo Benício no papel principal.
O empregado ilustrado Jacob, estupefato, interpela o Sr. Fulcanelli sobre o ocorrido com seu patrão, senão estranhando sua duplicação, já desconfiando que nesse desdobramento a verdade está na outra margem que seus sentidos atingem por reconhecer nesse outro alguém mais capacitado para essa existência ficcional do que o eu verdadeiro de seu amo, contudo, se nega a crer nisso objetivamente, opõe-se sua racionalidade ao fato que tem diante de si, quer mesmo precipitá-lo ao pesadelo pelo insólito que carrega e não o compreende, porque anseia pelo esclarecimento deste outro iminente cientista, talvez mesmo amigo do Dr. Elsius Bergier; anseia que o socorro não tarde para não cair aparvalhado sobre si mesmo e acomodando-se dar ao extraordinário uma feição natural para que seu juízo não reponte na direção da loucura
Temo, entretanto, certa semelhança, que depois erradicada, com Dorian Gray no procedimento de desnaturação do protagonista em favor desse outro que emerge do espelho. Em poucas linhas em que se alude o envelhecimento de um e o rejuvenescimento do outro. Nada que interfira no produto final auferido pela ficção engendrada, nada que desmereça o trabalho empreendido, mas eu me certificaria em manter distância nessa emulação, mesmo tão forte e tão sedutora.
Outro ponto importante que asseveraria na construção do volume é o seguinte: intercalar narrativas que tratem da personagem que sofre a bilocação corpórea ou daqueles que presenciam o suposto milagre para alternar os estados de consciência durante a leitura, porque podem soar por demais iguais enfileiradas todas as estórias que se ocupem de mesmo assunto, mesmo se tratadas originalmente como você tem se preocupado em fazer quando as enceta.
A monotonia pode ser um mal advindo dessa atitude se não for corrigida por uma artimanha ficcional que ligue as narrativas sem violentá-las com a convivência com que não lhes represente a própria natureza íntima do que tratam. Sinto-me estúpido dando-lhe conselhos que se não servirão de nada, afirmarão o que já lhe vai ao íntimo, despertado pelas inúmeras leituras do material que confecciona e como agudo primeiro leitor de si mesmo.
Escrevo às pressas, como sempre, para tentar honrar o compromisso de leitura e dar-lhe um parecer honesto – como sempre intento – do que li. Se verdade não fosse minha admiração pelo ficcionista e minha estima pelo amigo não locaria meu espírito, que não se sentiria confortável, sobre o que julgasse inútil ou desprovido do engenho necessário ao fazer artístico. Todavia, isso não nos acontece, porque em abundância se nos mostra a arte sua face de Proteu, incitando-nos a capturá-la com a nossa primitiva ferramenta – a linguagem. E, como aquele homem que procura adequar a visão ao ambiente escuro para perceber-lhe as nuanças; O Olhar da Bissetriz está repleto delas, o que já a coloca acima de muito do que se escreve por aí.
Perdão pelo que vai mal- escrito.
Abçs
Mariel Reis
Embora não seja habitual minha manifestação acerca do que leio através de carta não posso furtar-me da utilização de meio tão arcaico para transmitir as impressões exatas que me sobrepujaram após a leitura de seu trabalho, acertadamente o conto “O Olhar da Bissetriz”. Este de uma execução atilada sob a perspectiva que você resolveu adotar para nortear sua criação do livro homônimo – isto se não encontrou outro nome para batizá-lo, enquanto repousava nesta outra plaga, embalado pelo ciciar dos coqueiros e da melíflua voz de mulher amada – retomo depois de minha divagação, a perspectiva do duplo. É certo que deve ter notado que me faço opinar semelhantemente a natureza formal do conto: uma epístola.
Este condicionamento já o posiciona modernamente entre os gêneros caros ao pós-modernismo que se valeu dessas formas para elevá-las em seus status à categoria de alta literatura. O pós-modernismo é um blefe, porque tal procedimento já pode ser detectado em obras de raríssimo lavor no século XIX em autores do romantismo alemão. Em nada essa minha observação empana o brilho do método sobre o qual se arquitetou para inserir o espírito narrativo em uma forma em que a verossimilhança não saísse prejudicada do embate. E o leitor conservasse aceso o pacto de ilusão tão caro à literatura de qualidade em produção por você e ligada à temática que não se descola de todo do período literário aludido. Tendo-o mesmo transpassado e transladado para outros países, apegada ao imaginário de um sósia, errante desgarrado e até aferrado à ciência com seus clones, migrados para os produtos de tevê como a novela de Glória Perez que contava com Murilo Benício no papel principal.
O empregado ilustrado Jacob, estupefato, interpela o Sr. Fulcanelli sobre o ocorrido com seu patrão, senão estranhando sua duplicação, já desconfiando que nesse desdobramento a verdade está na outra margem que seus sentidos atingem por reconhecer nesse outro alguém mais capacitado para essa existência ficcional do que o eu verdadeiro de seu amo, contudo, se nega a crer nisso objetivamente, opõe-se sua racionalidade ao fato que tem diante de si, quer mesmo precipitá-lo ao pesadelo pelo insólito que carrega e não o compreende, porque anseia pelo esclarecimento deste outro iminente cientista, talvez mesmo amigo do Dr. Elsius Bergier; anseia que o socorro não tarde para não cair aparvalhado sobre si mesmo e acomodando-se dar ao extraordinário uma feição natural para que seu juízo não reponte na direção da loucura
Temo, entretanto, certa semelhança, que depois erradicada, com Dorian Gray no procedimento de desnaturação do protagonista em favor desse outro que emerge do espelho. Em poucas linhas em que se alude o envelhecimento de um e o rejuvenescimento do outro. Nada que interfira no produto final auferido pela ficção engendrada, nada que desmereça o trabalho empreendido, mas eu me certificaria em manter distância nessa emulação, mesmo tão forte e tão sedutora.
Outro ponto importante que asseveraria na construção do volume é o seguinte: intercalar narrativas que tratem da personagem que sofre a bilocação corpórea ou daqueles que presenciam o suposto milagre para alternar os estados de consciência durante a leitura, porque podem soar por demais iguais enfileiradas todas as estórias que se ocupem de mesmo assunto, mesmo se tratadas originalmente como você tem se preocupado em fazer quando as enceta.
A monotonia pode ser um mal advindo dessa atitude se não for corrigida por uma artimanha ficcional que ligue as narrativas sem violentá-las com a convivência com que não lhes represente a própria natureza íntima do que tratam. Sinto-me estúpido dando-lhe conselhos que se não servirão de nada, afirmarão o que já lhe vai ao íntimo, despertado pelas inúmeras leituras do material que confecciona e como agudo primeiro leitor de si mesmo.
Escrevo às pressas, como sempre, para tentar honrar o compromisso de leitura e dar-lhe um parecer honesto – como sempre intento – do que li. Se verdade não fosse minha admiração pelo ficcionista e minha estima pelo amigo não locaria meu espírito, que não se sentiria confortável, sobre o que julgasse inútil ou desprovido do engenho necessário ao fazer artístico. Todavia, isso não nos acontece, porque em abundância se nos mostra a arte sua face de Proteu, incitando-nos a capturá-la com a nossa primitiva ferramenta – a linguagem. E, como aquele homem que procura adequar a visão ao ambiente escuro para perceber-lhe as nuanças; O Olhar da Bissetriz está repleto delas, o que já a coloca acima de muito do que se escreve por aí.
Perdão pelo que vai mal- escrito.
Abçs
Mariel Reis
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