Coculilo e a Repetição

A repetição paisagística na obra de Francisco Coculilo é parte de uma experiência sensorial com os elementos da composição. Quando a percebemos quase exaustivamente em seus quadros não atentamos que o pintor busca uma intersecção entre os elementos da pintura como para descobrir o real diante de uma cena adâmica: a Baía de Guanabara. Isso se assemelha a lição de Monet quando se debruçava sobre a natureza, estudando-a sob as variações luminosas, descobrindo as camadas de realidade que pode conter um mesmo espaço – ali onde a pintura se instalará – revelando a característica escultórica, me explico, as dimensões em que pode ser investigada, fornecendo ao artista não a mesma paisagem, mas um outro senso de perspectiva do natural.

Porque quando a natureza é transferida para um suporte, sendo representada, está sofrendo uma transformação em seu conceito de natural, neste não há somente aquilo que o pintor vê – como um olho – coexistem nessa percepção uma interferência que transferirá ao objeto a transvaloração de si mesmo. Isto parece ter sido parte do projeto do paisagista Francisco Coculilo ao representar com intensidade a natureza – ele não somente a falsifica como a recria, é fácil perceber quando se observa uma pintura de sua autoria que não diferem dos grandes painéis cenográficos usados pelo cinema quando ainda se usava o estúdio para filmar as películas. E, nesta intenção, o olhar do pintor se renova e aperfeiçoa aquilo que mira, limpando a geografia daquilo que julga incorreções, projetando na imagem – porque a realidade já significa uma representação no sentido platônico – as descargas criativas de um pequeno demiurgo que se intromete através da re - criação a tornar mais belo o cenário em que repousa.

Esta volta do olhar sobre os mesmos motivos pode parecer monótona ao espectador viciado na velocidade e representa a re - volta do pintor para não integrar a nova ordem demolidora, perturbadora de uma paisagem onde o homem apenas está insinuado na pintura através da cidade que cintila à distância, dos pequenos barcos pousados como nuvens sobre a superfície da baía. Coculilo admite que o homem esteja presente no cenário natural, mas não que a subverta, que a reinvente ou a capacite de belezas que não precisa. É um projeto que rejeita as manifestações modernistas, porque adulteram de modo negativo a natureza. O pintor julga que sua intromissão é positiva, soma ao conjunto de elementos vistos uma harmonia que estava em seu interior e ao repeti-la continuadas vezes é como se integrasse a uma sinfonia não cansa aos ouvidos, servindo de música ambiente aos temas que desenvolve, completando a criação daquilo que ela está destituída. Pretensão? Cabe somente ao espectador formar sua opinião.

Comentários

Anônimo disse…
Muito bem dito e comparado. Mariel.
A comparação aos painéis cinematográficos foi perfeita.

É isso mesmo, a repetição na obra de Coculilo é relativa, tendo em vista que, ao olharmos novamente para um mesmo ponto, nem o observado, nem o observador serão mais os mesmo anteriormente e a luz, então, nem se fala. Coculilo buscou isso até o fim do vida, re-observando diariamente o mais belo cartão postal do mundo.

Abraços
Por que foi realizada essa dissertação sobre Francisco Coculilo?
Estou curioso porque sou casado com sua neta Mônica Coculilo que idealizou, montou e disponibilizou um site de seu avô.
Abraços de Jefferson Polegário.

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