Perfil Brasileiro VII

Não, não vou insistir para contar outra versão,mesmo porque não pode ter outra maneira de relatar o fato que não seja esta mesma em questão,não se pode fazer de uso e abuso de uma língua traiçoeira desta sem que se escorregue, sem que se intrometa no meio das palavras os quês e porquês, se mesmo quando se está vivo é impossível evitá-los, contorná-los sem que se arranhe a consciência no desvio, então não me atrevo a emendar mais uma linha no conto, se outro ponto aparecer a culpa não é mesmo minha que sempre tive pouco talento para esticar qualquer conversa, mesmo dificuldade para se botar um ponto final.

Mas, acho que não tem importância.

O melhor mesmo é desembuchar as coisas todas bem devagar para que a prosa tome corpo, não pareça conversa mole de passante de botequim como muitos pensam que sou e possa mesmo parecer se enfrentado com um olhar atento os meus trajes – não são de rei, porém plebeu nenhum enverga uma camisa bonita como esta, toda estampada, vinda da capital de contrabando. Então, não se pode mesmo dizer que sou desleixado, porque me arrumo bem com os panos que tenho, mas não ponho questão de estar na moda para atrair os olhos das moçoilas, mas não seria nada mal se elas olhassem para os lados de vez em quando.

Quase morri ontem.

A morte não causou má impressão, porque nem chegou a riscar de leve o fósforo da lanterna para alumiar o caminho direito. Deus aparou o golpe. Forte,aliás. E não sendo eu homem que intente provocar discordância entre iguais, digo, se era mesmo Deus ou não também não me interessa, ou para não ser blasfemador, interessa, mas pouco, se estivesse morto um monte de outras aporrinhações também arredariam pé, mas deixe estar, não me revolto, porque não há nada como um dia após o outro e com sorte me extingo, não dou notícias por telefone e que dirá por médium, minha linha estará sempre ocupada, quando não fora do gancho.

Aí me evado para os campos celestiais a prosear com os anjos, jogar charme paras as anjas, arrumar sacanagens com todas elas atrás das nuvens, ensinar safadezas gostosas que elas revirarão os olhinhos agradecendo pela descoberta. E se Deus intervir, aí falo da chatura de um lugar todo organizado com hora para entrar, sair, comer e cagar. Mas está aí o que nunca me perguntei: as criaturas celestes têm necessidade? Passam as aperturas comuns aos homens quando se está desarranjado? E caí na cabeça de qual filadaputa o desarranjo da feijoada das serestas nosd rodopios das estrelas? Eu mesmo nunca vi cair do céu, senão chuva. Tomará a Deus que não demore mesmo o dia em que no meio de uma avenida da cidade comece a chover bosta. Os homens com os ternos sujos da merda dos anjos. Isso seria uma espécie de vingança, não seria? Os sapatos pesados de merda.

As mulheres mais religiosas e histéricas passando a merda no corpo como lama medicinal, rasgando o corpo para se besuntarem toda com a merda que Deus manda para os homens, os porcos refocilando a vontade como se aquilo fosse a representação do juízo final da raça dos suínos – o mundo acabando em merda e eles felizes. Não,eu não senhor, até acho a borra de alguns animais cheirosas,mas quando o homem toca a mão, toda a coisa apodrece. Não há jeito às vezes de consertar. Essa estória de merda é bem nojenta, eu sei, mas o que posso fazer? Não podem me condenar, podem? E eu poderia ir mais longe, mas encabulado prefiro escutar os conselhos que o senhor me dá, não é cristão pensar nos cuzinhos dos anjos abertos, sentados lá no alto, em nuvens macias, a defecar em cima de nós, sem nenhuma piedade, acho até que tomam isso como uma favor, mas não é saudável ter pensamentos desta natureza, porque anjos não tem sexo, não é o que dizem?

Mas o que eles comem, aproveitam tudo? Aproveitam mesmo o que não presta? Nada neles vira merda? Mijo? Neles nada se perde, tudo se transforma.

Se é assim eu mesmo queria ser uma anjo, porque neste calor que está fazendo, depois da feijoada na casa de Albertina a coisa toda desandará, mais tempo ou menos tempo. Se eu vi? Adiantaria confirmar o que vi se não tem valia coisa alguma que esse estropiado diga, porque onde já se viu se afirmar que um dia choveu merda, que do alto da árvore lá do quintal vi o cuzinho róseo da anja se abrindo como um botão de flor,largando sobre a minha cara a coisa mais perfumada que pode sair da bunda de uma criatura, adiantaria dizer, sim, eu vi, pode me acreditar? Não, você arredaria o pé daqui e nunca mais voltaria, e diria aos outros da minha loucura, que era bom manter distância, que não vale mesmo a pena, que se tratassem de estórias, sim, era bom que se pudesse registrá-las, porque capiau é bom mesm de causo, faria documentário, mostraria minha maneira de expor o caso, assim, volteando, mas se dissesse que é verdade, sua simpatia estaria perdida, você se levantaria e tocaria na ponta do chapéu se despedindo,então é tudo uma versão, não é assim que se diz quando se quer ganhar o favorecimento dos fatos, sim, isto é uma versão, não posso corrigir os meus olhos, se é isso que vêem, nem desmentir minha consciência, quando ela dispõe desses raciocinios,valham pouco ou nada valham, porque são meus. Se você faz caso dos seus que são bem menos interessantes, imagine eu que tenho imaginação, como o povo daqui diz.

É melhor para por aqui, senão cometerei uma outra heresia, como afirmar que Jacó não era besta de abraçar anjo, porque aquilo lá era macho, aquilo que ele intentou agarrar era anja e das boas...

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