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Mostrando postagens de maio, 2012

Cativar - a última ceia

As minhas ações visam transformar, em primeiro lugar, a mim mesmo. Quando me debruço para escrever quero apenas dialogar com a parte de mim que naquele instante pede para ser avistada. É como descobri-la em meio a um nevoeiro e habitá-la com cuidado para que nada melindre a paisagem única que irá me mostrar - desolada ou verdejante. Em segundo lugar, porque me importa a opinião dos meus pares, não todos, mas somente daqueles que realizaram um bom texto literário, que somem à minha experiência suas riquezas nesses territórios conquistados por si mesmos. Em terceiro lugar, creio que não há remédio senão continuar a escrever. É a única maneira de prosseguir - pelo menos para mim - de adestrar demônios, de molestar minha carne para que não prolifere em maldades ou floresça em crimes. Somente continuando a escrever posso me certificar de alguém um dia poderá vir a se interessar pelo que enunciei. Há uma parte prática: a publicação. Tentar cativar um público, mantê-lo sob o domínio, sob o e

Metade

I Metade de nós está no presente A outra permanece invisível no tempo; Parte de nossa carne, poeira e vento E a outra passa incólume a tempestade. Metade atravessa o vale do esquecimento Enquanto a outra arde em saudade, Da parte que cai no desaparecimento - Uma nuvem de areia sobre a cidade. Uma parte de nós é constância Enquanto a outra, substância volátil; Que fundida ao infinito do espaço Alerta-nos de nosso breve trânsito. Tudo ao redor é limitado A alma flui para todos os lados. Metade de nós está no passado Repousa na origem dos tempos, A outra se esvai como a sombra... Ó Allah, ensina-me o segredo do silêncio Permita-me aceitar a minha morte, Qual o truque de um mágico Que me guardasse junto das coisas eternas.
I Os anjos são espiões Habitando entre as estrelas... Ó criatura tão perfeita Que provoca o ciúme celestial, Por que não lhes pede um par de asas E vai morar com eles no céu? II Embaixo do pessegueiro em flor Sob a noite que ascende no horizonte, O aroma mistura-se ao calor que sobe da terra. Consulto as estrelas para saber quem sou, E a lua brilha no Oriente... III Para consorte o bom amante Deve seguir duas regras: Tornar o amor sempre presente E rodar por toda a terra Murmurando apenas o nome Que é a chave de sua alma... Para quando a morte o chame Mostrar que é um caminho sem volta O coração do amante.
I Ó Allah, ela desperta do sono! Estica-se para se livrar da armadilha Invisível que lhe envolve os membros... Sente o torpor no dorso branco Qual o monte de açúcar Com que adoço meu paladar. Dirige o olhar frágil Para a luz que fere delicada suas pálpebras E não há palavras por vê-la renascendo Para depois cair desfalecida de amor em meus braços. II Os reis não possuem tesouro comparável. Os arquitetos reais nunca construíram Monumento a que equipara - la. Não há ornamento de prata ou ouro Nem riqueza sobre a terra Que se compare ao doce hálito de sua fala. III O meu espírito perturba-se na sua ausência. Debate-se nas sombras das feras Tomba no ostracismo do espaço Dissolvido pela música eterna. IV O coração não se queixa. Não há sofrimento, Nem infelicidade Quando suas mãos hábeis Mexem nos meus cabelos. V Ela desperta do sono Coberta de pedrarias invisíveis Vestida com a túnica sutil Do meu desej

Para Aurea

I   Embora o trabalho e os dias Encham meu espírito de tédio, E o cansaço de toda a justiça Perturbe aos meus ouvidos Com o apelo inútil De uma tormenta... Eu repouso no sopro Que cobre os lírios Espalhados na sua face. II O vento célere entre os fios de ouro Trançados com ervas perfumadas. O calor afogueia as jóias do seu rosto, Murmuram orações os seus lábios de rubi. Os anjos em coro abençoam a sua visão E o meu coração confrangido Teme pela hora de partir. III Ó Allah, inventou a noite O perfeito disfarce do amante,   Encobre os rastros Que o leva à casa do amor. Ó Allah, inventou as marés A transposição perfeita Para mostrar quão inconstante É a natureza do coração. Allah inventou o poeta Para que cada coisa Ganhasse uma história E sua glória se misturasse A todas as criaturas.   IV O velho não sabe manejar a beleza da cortesã. Não sabe cosê-la com os fios da aurora Preparando-lhe uma túnic

A garçonete

Movimentava-se através da fumaça A bebida fazia-me crer em uma aparição, Os colares e as pulseiras brilhavam E a intensidade do que eu via Encontrava um caminho direto ao meu coração Era um curso d’água em uma colina A música do inseto na algazarra da tarde, O vozerio ruidoso dos homens E o agudo som dos talheres na mesa O cabelo tingido de escuridão Os olhos de uma fera acesa E a intensidade do que eu via Encontrava a minha alma levada pela correnteza. O avental repleto de gordura A predileção pela cozinha japonesa Pratos ricos em legumes e verduras Conservava toda sua beleza Era uma aparição eu cria Aproximou a boca aos meus ouvidos Pediu-me com o coração contrito O alimento de minha poesia E a intensidade do que eu sentia Encontrava a minha alma levada pela ventania. Movimentava-se através da fumaça A bebida fazia-me crer em uma aparição, Entre o vozerio raivoso dos homens Os talheres caídos no chão Quando me murmurou o seu

Brant

" Mariel, obrigado por me descobrir em um canto do mundo virtual para que eu a descobrisse e pudesse me maravilhar diante de sua poesia. Nesta noite de maio mineiro, de chuva e frio, me agasalho em suas palavras em sua voz de Prometeu misteriosa mulher vestida de noite entro em sua órbita de flor que atravessa meus olhos e me condena a admirá-lo. Parabéns, meu poeta. Fernando Brant. "

Atalho

É um caminho sem retorno Um abismo ali dentro luzia, O diabo pousa no contorno Das suas pernas fugidias. É perceptível o morno hálito Desprendido na correnteza Do ar. Traje negro e sumário Que esconde toda sua beleza O andamento imita a leveza Sucinta de um poema chinês, Sem tradução em português Devido à tamanha agudeza: Vestida de verdes labaredas Apascenta dentro do incêndio, O imenso e variado compêndio De todas as minhas incertezas. O demônio ali em sussurro Risca o corpo como um muro O desejo desenhado a giz São as linhas em tumulto Perfazendo a graça do vulto. .... Um abismo ali luzia Nas suas pernas fugidias...